Governo propõe digitalização dos serviços e substituição das 645 Casas da Agricultura por 16 escritórios de Defesa Agropecuária e outros 16 de Desenvolvimento Rural. Produtores têm receio de que mudanças acabem com as visitas presenciais de agrônomos e veterinários. Reforma da assistência rural em SP preocupa técnicos e agricultores do estado
A reforma do modelo de assistência técnica rural, proposta pelo governo do estado de São Paulo, tem preocupado técnicos e agricultores, antes mesmo de sair do papel.
O texto completo do decreto que irá regulamentar as mudanças ainda não foi publicado, mas uma das propostas é digitalizar todos os serviços hoje prestados pela Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI).
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Porém, entre os produtores rurais, há um receio de que a reestruturação acabe com as visitas presenciais dos agrônomos, veterinários e pesquisadores. Os técnicos, por sua vez, temem demissões.
O governo paulista propõe também substituir as 645 Casas da Agricultura da CATI – que, por quase 80 anos, deram suporte a pequenos agricultores – por 16 escritórios de Defesa Agropecuária e outros 16 de Desenvolvimento Rural.
Além disso, deverá ser criada uma central de atendimento ao agricultor.
“Na verdade é uma modernização. A ideia é trazer o serviço público ao mesmo estágio de desenvolvimento do agronegócio. Principalmente em São Paulo, onde o agronegócio se desenvolveu muito”, diz o secretário de Agricultura, Gustavo Junqueira.
Receio da digitalização
Wilson Diego Kodel é um dos agricultores paulistas que se assustou com a reforma.
“Olha, eu sou o básico do básico mesmo. Facebook, WhatsApp, bem complicado, eu sou bem devagar. Isso que eu sou um dos mais novos em casa. Os mais velhos sem chance. Pai, mãe, sem a mínima chance. Atender um celular é complicado”, diz.
Já o veterinário Júlio Silva diz que a informatização do setor é necessária, mas que esse processo deveria ser feito de forma gradual.
“É lógico que tem que ter uma evolução (…) Mas o que o produtor sabe é produzir. Essa evolução tecnológica tem que ser gradativa”, diz.
O governo paulista garante, por sua vez, que ainda haverá assistência técnica presencial nas fazendas.
“Não tenho nem dúvida (de que haverá visitas presenciais). A relação entre as pessoas é fundamental, apesar da gente conseguir fazer muita coisa de maneira remota”, ressalta Junqueira.
Casas da Agricultura
As Casas da Agricultura da CATI sempre ofertaram diversos serviços gratuitos aos agricultores paulistas, como consultorias de veterinários e agrônomos, com o intuito de incentivar a produção no campo.
Essas unidades ajudaram a desenvolver regiões importantes. Em Guaratinguetá, no Vale do Paraíba, por exemplo, elas mudaram a vocação produtiva de uma comunidade inteira, ao estabelecer, na região, o cultivo do arroz.
Na década de 1960, os técnicos do município desenvolveram um projeto que irrigou toda a região para manter os arrozais.
“A CATI foi muito importante para o desenvolvimento de semente no nosso Vale. Nossa produtividade dobrou em 40 anos de pesquisa”, conta o agricultor Ademar Ligabo.
“Mas não é só pesquisa. A extensão rural também é importante. (…) O produtor procura as casas de lavouras e tem acesso a novas técnicas. Isso é muito importante, principalmente para quem está começando. (…) A CATI tem um corpo de técnicos muito experientes”, acrescenta.
Diminuição da assistência técnica
Ao longo dos anos, muitas unidades da CATI deixaram de funcionar por falta de funcionários. As Casas de Agricultura, que já chegaram a ter 10 mil servidores, tem hoje apenas 3.223 técnicos na ativa, segundo dados da Associação Paulista de Extensão Rural (Apaer) .
Os servidores foram se aposentando e o governo do estado não abriu mais concursos para repor as vagas, de acordo com a Apaer.
“Houve realmente então um desmonte, um sucateamento”, diz o presidente da associação, Antônio Marchiori.
No município de Itobi, por exemplo, a unidade da CATI está fechada há, pelo menos, cinco anos. O imóvel está abandonado e se deteriorando.
“O pequeno produtor é o cara que tem menos escolaridade, menos informação e menos recursos. Tudo o que ele necessitava, ele ia na Casa de Agricultura”, lembra o agricultor Ademir Vedovatto.
Em sua propriedade, eram feitas pesquisas sobre o cultivo da cebola que chegaram a ser publicadas fora do país.
Atualmente, sem dinheiro para bancar assistência técnica, Ademir parou com o cultivo de hortaliças e planta somente um pouco de milho e mantém animais para a sua própria subsistência.
“As grandes propriedades plantam commodities, soja, cana-de-açúcar. Esses produtores têm como pagar uma assistência técnica, uma consultoria. Mas os pequenos produtores da agricultura familiar não têm como pagar por esse trabalho. Então eles necessitam do apoio do estado”, diz Sérgio Diehl, presidente da Associação dos Assistentes Agropecuários do Estado de São Paulo (Agroesp).
Medo de demissões
Um outro receio dos técnicos é de que a reestruturação reduza ainda mais o número de funcionários. Sobre isso, o secretário de Agricultura de SP afirma que não haverá demissões e que todas as mudanças serão graduais.
“Esse programa não é um programa de redução do tamanho do estado. É um programa de adequação do estado à estrutura que nós temos. Ou seja, hoje nós temos 3.300 servidores e a estrutura montada na secretaria é uma estrutura de 1993. É uma estrutura montada para dez mil funcionários, em um momento completamente diferente", ressalta Junqueira.
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