De acordo com economistas ouvidos pelo G1, números da próxima divulgação escondem efeitos estruturais na economia que devem se prolongar por bastante tempo. Funcionário de restaurante na Zona Sul, em São Paulo, usa máscara e protetor facial na reabertura para o público Marcelo Brandt/G1 Depois de um tombo histórico de 9,7% no segundo trimestre de 2020, o repique positivo previsto para a economia no terceiro trimestre não é motivo para comemoração, dizem economistas consultados pelo G1. O alento é que dados de atividade divulgados nesta terça-feira (1º) dão direções mais certeiras para entender e encaminhar a recuperação da economia à frente. PIB tem tombo recorde de 9,7% no 2º trimestre e Brasil entra de novo em recessão As pesquisas mensais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) davam conta de um curso de recuperação acentuada entre abril e junho, trazendo para mais perto dos patamares pré-pandemia do novo coronavírus. E parte do problema é esse: o Brasil continuará 'abaixo' de uma economia que já não vinha em momento de crescimento expressivo. De acordo com cálculos do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), o PIB do terceiro trimestre deve avançar 5,8% em relação ao anterior, mas vir 5,5% abaixo do mesmo período de 2019. "A notícia boa é que a situação não deve piorar mais. Vínhamos revisando as projeções sempre para baixo e as surpresas foram positivas. Tiramos do horizonte cenários muito ruins", diz Luana Miranda, economista do Ibre/FGV. Três fatores estão no radar dos economistas para o trimestre que se fecha em setembro: a manutenção da economia em funcionamento – sem novos chacoalhões causados pela pandemia –, os efeitos das transferências de renda no consumo e a sustentabilidade de um ambiente econômico favorável, com juros baixos e gastos responsáveis. O caminho da recessão: como o Brasil chegou à queda histórica do PIB Avanço da reabertura Como mostra reportagem do G1, os programas de composição de renda e manutenção de emprego foram fundamentais para amortecer a queda no segundo trimestre, em especial o Auxílio Emergencial. A dúvida agora é o potencial que os auxílios terão para incentivar a economia que vem reabrindo lentamente. Com bares, restaurantes e comércio totalmente fechados em abril, não havia para onde o consumo extrapolar além do básico, como supermercados e farmácias. Nos meses de maio e junho, começou a se desenhar um avanço, ainda que longe da mesma força do pré-crise. No terceiro trimestre, além do reforço de renda dos auxílios para quem tem renda mais baixa, os economistas apostam que o aumento de poupança em classes mais altas pode compensar o consumo represado no trimestre anterior. Segundo estimativa do Itaú Unibanco, a renda guardada pelo brasileiro oscilava em um patamar de 10% da renda antes da crise. Os economistas do banco observaram um salto para 18% durante a pandemia. Com dinheiro na mão, os indicadores de acompanhamento diário de atividade do banco passaram a mostrar que o setor de serviços prestados às famílias – justamente os bares, restaurantes, viagens, entre outros – teve em agosto seu primeiro momento de melhora. De abril a julho, o segmento amargou uma queda à metade do que se consumia antes do início da crise. "O agronegócio nem sofreu com a crise; a indústria caiu forte em abril, mas está se recuperando rápido; e os demais serviços, como transportes e comércio, estão em melhor momento. Essa evolução já traz um carrego positivo para o terceiro trimestre", diz Luka Barbosa, economista-sênior do Itaú Unibanco. Para que esse cenário se mantenha e haja uma retomada vigorosa, o país depende de um controle pleno do coronavírus. No meio do terceiro trimestre, que termina neste mês de setembro, o Brasil ainda enfrenta média móvel de cerca de 900 mortes por dia pela Covid-19. A esperança dos economistas é de que não se dê passos para trás causados por novas ondas de contágio e medidas de isolamento. "O mercado, como um todo, espera que a economia vai estar mais aberta amanhã do que hoje. E mais aberta no mês que vem do que neste", afirma Barbosa. Indústria tomba quase 20% no segundo trimestre em relação ao mesmo período em 2019 Contas públicas Para Alberto Ramos, diretor de pesquisa econômica para América Latina do Goldman Sachs, o momento de calmaria, em que o brasileiro tem acesso à renda, poderia ser usado para discutir mudanças estruturais para a entrada de 2021. O economista acredita que os riscos às contas públicas não estão tendo a devida atenção. É um momento em que a relação dívida/PIB do país se aproxima de 100% e o economista lembra que o governo envia sinais trocados sobre seu compromisso com a responsabilidade fiscal. "Se essa agenda fiscal for comprometida, seja pelo próprio governo, seja com apoio do Congresso, o mercado fica mais nervoso e atrasa uma evolução do quadro", afirma Ramos. Rombo nas contas do governo supera a marca dos R$ 500 bi até julho, pior resultado da história Com déficit de R$ 800 bilhões previstos para o ano, Ramos destaca que o investimento fiscal "extraordinariamente elevado" foi necessário. Mas, depois de um longo período de fragilidade nas contas públicas, só com boas garantias de previsibilidade de gastos seria possível manter o interesse do investidor no país, que proporcionaria retomada do investimento e emprego. "Brasil continua sendo uma economia com produtividade baixa, crescimento baixo. Você não melhorou nesse sentido, e sabemos que eventualmente até piorou em potencial quando as coisas se normalizarem", diz. Uma mudança de direção, diz, seria grave o suficiente para que os economistas voltassem a fazer contas. Initial plugin text