Capa do álbum “Sinceramente”, de Sérgio Sampaio Paulo Breitschat ♪ DISCOS PARA DESCOBRIR EM CASA – “Sinceramente”, Sérgio Sampaio, 1982 ♪ É tristemente inacreditável que, em 1982, ano em que apresentou o LP “Sinceramente”, último dos três álbuns que lançou em vida, Sérgio Moraes Sampaio (13 de abril de 1947 – 15 de maio de 1994) já estivesse esquecido no universo pop nacional. Afinal, fazia então somente dez anos que Sampaio – cantor e compositor capixaba nascido na mesma cidade de Cachoeiro de Itapemirim (ES) que, seis anos antes, em 1941, tinha gerado Roberto Carlos – se tornara uma das sensações da música brasileira ao defender em escala nacional marcha de autoria própria, Eu quero é botar meu bloco na rua, na sétima e última edição do Festival Internacional da Canção, exibido em 1972 pela TV Globo. Mesmo sem vencer o derradeiro FIC, a marcha projetou Sampaio que, contratado pela gravadora Philips, editou single best-seller daquele ano com a composição do festival e, no embalo, lançou em 1973 o primeiro álbum, também intitulado Eu quero é botar meu bloco na rua. Tudo fazia supor que Sampaio – desde 1967 na cidade do Rio de Janeiro (RJ) – ia enfim decolar na carreira de cantor, iniciada em 1971 na gravadora CBS com edição de single autoral com as músicas Ana Juan – parceria com o compositor baiano Odibar Moreira da Silva – e Coco verde. Até porque a marcha Eu quero é botar meu bloco na rua se comunicara facilmente com o público do Brasil, ao contrário do anárquico álbum coletivo Sociedade da Grã-Ordem Kavernista apresenta Sessão das 10, gravado por Sampaio com Edy Star, Miriam Batucada (1946 – 1994) e Raul Seixas (1945 – 1989), mentor desse LP editado pela mesma CBS naquele ano de 1971. Só que, de repente, tudo desandou com o fracasso comercial do álbum solo de 1973. Artista de temperamento forte, do tipo que jamais se deixava domar por vontades de diretores artísticos de gravadoras, Sérgio Sampaio logo foi carimbado com o rótulo de “maldito”, posto também em outros cantores e compositores contemporâneos tão ou mais geniais e geniosos do que ele, casos de Jards Macalé e Luiz Melodia (1951 – 2017). Melodia permaneceu fiel até o fim da vida do amigo e, mesmo após a morte de Sampaio, aos breves 47 anos, sempre fez questão de reavivar a obra do compositor em discos e shows. Não por acaso, Melodia foi o único convidado do álbum “Sinceramente”, gravado em janeiro de 1982 nos estúdios Transamérica, na cidade do Rio de Janeiro (RJ), com arranjos criados pelo próprio Sérgio Sampaio com o pianista Zezinho Moura, um dos músicos arregimentados para o disco. O Negro gato cantou com Sampaio o agitado samba Doce melodia, composto pelo anfitrião em tributo ao próprio Luiz, cúmplice das dores e delícias de serem artistas indomados. Produzido por Sérgio Sampaio, o álbum “Sinceramente” apresentou no repertório onze músicas inéditas da lavra do compositor, na época já celebrado no meio musical pela habilidade de criar sambas, boleros, blues e sambas-canção, entre outros gêneros musicais, com assinatura original. Dez músicas eram frutos da criação solitária do autor. A exceção foi a balada Cabra cega, parceria com o poeta e letrista Sérgio Natureza, autor do texto escrito para o encarte do LP e reproduzido na edição em CD do álbum “Sinceramente”, lançada em 2008 pelo mesmo selo Saravá Discos (de Zeca Baleiro) pelo qual seria finalizado e apresentado em 2006 o álbum Cruel, deixado inacabado por Sampaio. Quando entrou em estúdio no versão de 1982 para dar forma ao LP “Sinceramente”, na companhia de músicos como o guitarrista Renato Piau e o saxofonista Oberdan Magalhães (1945 – 1984), Sampaio estava ansioso para escoar e registrar safra autoral que vinha (se) acumulando porque o segundo e então último álbum do artista, Tem que acontecer (1976), havia sido lançado já há seis anos. Após esse segundo álbum, Sampaio somente havia gravado um single em 1977 com as músicas Ninguém vive por mim e História de boêmio (Um abraço em Nelson Gonçalves). E então o artista amargou ostracismo que tentou interromper com “Sinceramente”, álbum fechado ironicamente com música intitulada Faixa seis. “Eu tenho andado sem turma / Mas solitário eu sei que não dá pé”, ponderou Sampaio ao fim dos versos da autobiográfica Homem de trinta, música com o qual o cantor abriu o disco em clima de inventário emocional. Na sequência, composições como Na captura, o belo bolero Tolo fui eu, Só para o seu coração e Essa tal de mentira corroboraram o tom confessional do repertório deste compositor que fizera Meu pobre blues para o conterrâneo Roberto Carlos e, sem ser jamais gravado pelo Rei, registrou ele próprio a música em single de 1974. “Não há nada mais bonito / Do que ser independente”, celebrou Sampaio na música-título Sinceramente, em versos de sentido amplificado pelo fato de o álbum ter sido inteiramente gravado e posto no mercado de forma independente, com a produção custeada pelo pai da mulher do artista, Angela Breitschat, e com a foto da capa tirada pelo cunhado Paulo Breitschat. As músicas Nem assim e Meu filho, minha filha completaram o balaio de Sérgio Sampaio neste disco de 1982 – reeditado em 2019 no formato original de LP – que escancarou a franqueza de artista que sempre foi sincero, você sabe muito bem. E, se não sabe, procure saber…