Pedro Waengertner, presidente da Ace: empreendedores precisam criar uma cultura de inovação nos seus negócios (Mariana Fonseca/Exame)
A pandemia do novo coronavírus tornou mais urgente para as empresas uma necessidade que as rápidas mudanças tecnológicas e de estilo de vida dos últimos anos tinham criado: inovar constantemente.
“Sempre haverá alguém que está pensando em como atender melhor o seu cliente. Que essa pessoa seja você”, diz Pedro Waengertner, professor de inovação e empreendedorismo e fundador da Ace Startups, três vezes eleita a melhor aceleradora de startups da América Latina. Em parceria com a EXAME Academy, divisão de educação da EXAME, a Ace está lançando o curso online Inovação na Prática.
O olhar atento para a transformação do negócio é ainda mais fundamental em momentos de crise como o atual. “Quem está apenas preocupado em sobreviver e cortar custos terá perdido uma oportunidade importante e relativamente única de dar um salto quando a pandemia acabar”, diz Carolina da Costa, professora e fundadora do centro de inovação do Insper e sócia do fundo Mauá Capital para novos modelos de negócio.
Mas criar uma cultura de inovação dentro de um negócio de qualquer porte não é simples – e não há uma única maneira de fazer isso. Dispor-se a experimentar caminhos diferentes, investir em startups e criar uma unidade formal de inovação dentro da empresa são algumas das sugestões dos especialistas aos empreendedores que precisam se reinventar. Leia a seguir oito dicas para transformar seu negócio e se antecipar às mudanças do mercado.
1 – “Mate” seu próprio negócio
Diversos eventos podem prejudicar o negócio de uma empresa. Novas tecnologias, canais de venda, competidores, crises econômicas ou até uma pandemia como a atual. A empresa precisa não só estar atenta a essas ameaças como deve se adiantar a elas. “Sabemos que os negócios têm ciclos e esses ciclos estão se encurtando”, diz Waengertner.
O surto da infecção respiratória covid-19, por exemplo, exigiu que empresas tivessem canais de venda e atendimento digitais. Quem já estava investindo nessas iniciativas, ainda que as vendas físicas fossem muito mais relevantes, sofreu menos e conseguiu manter parte das receitas apesar das medidas de isolamento social e do fechamento do comércio físico no Brasil. Quem não tinha esses canais precisou se adaptar de uma hora para outra, perdendo dias ou semanas de venda.
2 – Mantenha o foco no cliente
As empresas mais inovadoras não são aquelas com a tecnologia de última geração, diz Waengertner, mas as que entendem o que o cliente busca e entregam com excelência. A tecnologia muda. Por isso, para blindar a empresa contra a crise é necessário estar atento ao cliente. Um exemplo nesse sentido é a Amazon. “Mesmo com todos os problemas, como as discussões sobre o impacto da Amazon no meio ambiente ou sobre a contaminação de funcionários pelo coronavírus nos centros de distribuição, a Amazon é a marca mais valiosa do mundo”, afirma o fundador da Ace. Segundo o professor, isso acontece porque a varejista americana supera as expectativas dos clientes e consegue até prever o que eles vão querer comprar.
Não é preciso ter uma grande estrutura de inteligência artificial – pegar o telefone e ligar para o cliente funciona muito bem. Para Costa, isso também exige um exercício de empatia, de se colocar no lugar do cliente para entender suas necessidades, sua jornada de compra ou seus problemas com a empresa, marca ou produto.
3 – Priorize
Em qualquer área da empresa há diversas oportunidades de inovação, do departamento de recursos humanos ao financeiro. Até mesmo para vender produtos há vários canais, muito além das lojas físicas e do comércio eletrônico. Plataformas de marketplace, redes sociais como o Instagram ou até o Whatsapp, com envio da maquininha ao cliente ou link de pagamento online, são opções válidas. Com um orçamento e equipes limitados, como saber em qual oportunidade investir primeiro? Waengertner aconselha identificar a avenida que, com o menor investimento, tem a oportunidade de trazer mais resultados.
4 – Encare os erros como uma startup
A probabilidade de uma startup virar um unicórnio – com valor de mercado superior a 1 bilhão de dólares – é baixa, e a operação desse tipo de negócio envolve riscos que vão de um novo concorrente mais forte a brigas entre os sócios. E, mesmo com todo o investimento e cultura de inovação, é provável que algumas dessas novas ideias – ou muitas – não vinguem. Mas, se der certo, o ganho de valor é gigantesco.
Sabendo das chances de um negócio inovador dar errado, as empresas convencionais tendem a ser mais conservadoras para não perder dinheiro, mas Waengertner encoraja o empreendedor a pensar como as startups ou como investidores. O ideal é não colocar todo o dinheiro em uma única aposta, mas sim construir um portfólio de inovações, startups e novas avenidas de crescimento. Se um determinado projeto apresentar bons resultados, pode receber mais investimento. Caso dê errado, o valor gasto não terá sido tão grande.
Também é importante aprender com esses erros. Os problemas não estão restritos à área de inovação – pode haver processos ineficientes ou falta de conversa entre equipes que deveriam trabalhar melhor juntas, por exemplo. A empresa precisa estar aberta para reconhecer os erros e promover essas discussões entre os funcionários. “A liderança tem um papel crucial para fomentar essas conversas e relações de confiança”, diz Costa.
5 – Coloque ciência nos investimentos
Uma frase comum no meio de inovação é que é mais fácil virar uma canoa do que um transatlântico. Assim, transformar uma grande empresa é muito mais complexo do que mudar uma startup. Por isso, é necessário começar aos poucos. A área de inovação pode ajudar na criação de novas ideias, mas colocá-las em prática exige uma abordagem científica.
O departamento de recursos humanos pode ter encontrado uma nova maneira de realizar processos seletivos com a ajuda de inteligência artificial, por exemplo. No lugar de migrar todas as contratações para esse novo método, a empresa deve realizar experimentos, como conduzir um ou dois processos seletivos com essa nova ferramenta, e comparar os resultados com o método tradicional. Só aí é que o novo processo, se bem sucedido, pode aos poucos substituir o antigo.
6 – Seja uma empresa ambidestra
Waengertner diz que a empresa deve sempre buscar dois caminhos. De um lado, precisa focar o crescimento de seu negócio principal. Do outro, precisa buscar novas avenidas de crescimento, criar novos negócios e canais de vendas. “É preciso olhar para o horizonte de dois a três anos no futuro”, afirma.
O Magazine Luiza é um exemplo, diz o investidor. Enquanto se concentra em melhorar o seu negócio principal, de venda de eletrônicos e eletrodomésticos em lojas físicas e no comércio online, amplia suas possibilidades. A compra de startups especializadas em serviços de apoio, como logística, a aquisição da Netshoes, que atua em um mercado diferente, o de vestuário, são amostras dessa estratégia ambidestra.
7 – Estimule a liderança a patrocinar a inovação
Uma ferramenta comum usada por empresas para criar esses novos negócios são os laboratórios de inovação. É um espaço dentro da companhia, muitas vezes com uma equipe própria, dedicado a pensar em novas iniciativas. Também pode ser a divisão responsável por monitorar o mercado de startups de olho em oportunidades de compra ou parceria.
Essa é normalmente uma divisão que exige um investimento considerável. “A empresa abre mão de receita hoje para financiar o futuro”, diz Waengertner. Por isso, essa área precisa estar bastante ligada à diretoria, tanto para receber o investimento necessário quanto para ter a colaboração de outras áreas, com dados e testes.
8 – Crie uma cultura de criatividade
A pandemia e a imposição do home office mostraram para muitas empresas que os espaços de inovação e a adoção de novas tecnologias não eram o mais importante, entretanto. “A busca por novas tecnologias era a discussão mais em voga antes da crise, mas hoje o que predomina é a cultura, focada nas pessoas”, diz Costa. As empresas devem criar maneiras para permitir as conversas entre funcionários, de forma transparente. Assim, podem surgir novas ideias e soluções.
Não adianta inovar apenas para fora. Uma área de inovação grande, com um espaço bonito e programas de parcerias com startups, não garante que a empresa esteja tendo bons resultados e, de fato, criando novos serviços úteis para os clientes. “Não é o ambiente que inova. Quem inova são as pessoas e a empresa precisa criar condições para as pessoas performarem”, diz Waengertner.
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