Paulo Autran em cena de 'Terra em transe' Divulgação A lei do Presidente é de ferro e fogo para os que não são amigos, pois estes merecem mais do que tudo. Nas suas últimas declarações, confirmou mais uma vez seu total despreparo para o cargo que ocupa e revelou sua mais profunda imersão no Brasil tradicional, no Brasil do “aos amigos tudo”. O senhor Adriano da Nóbrega, ex-capitão da Polícia Militar, acusado de pertencer a um grupo de matadores de aluguel, foi morto pela polícia da Bahia. Havia sido condecorado com a mais alta medalha da Assembleia do Rio de Janeiro por Flávio Bolsonaro a pedido do pai, o Presidente, segundo declaração do próprio. Ato contínuo à abertura das investigações, o Presidente pediu uma perícia para verificar suposta tortura e assassinato, pois a polícia da Bahia é do PT, insinuando um complô. Contra quem? Assim, o Presidente, que era a favor da tortura, se declarou, sem mais, um amante dos direitos humanos, como bem disse o colunista Bernardo Mello Franco na sua crônica “Milagres de Adriano”, no jornal O Globo do último dia 19. Mas, na realidade o Presidente tem demonstrado que suas ideias são arraigadas na tradição brasileira do clientelismo e do compadrio, que nada trazem de novo à política brasileira, a não ser na forma ríspida e na falta de decoro que eram, até então, evitadas em público. E tem mais, o Presidente parece também preso às teias da feitiçaria. Tudo o que acontece é produzido por alguém que o boicota ou age propositalmente para atacá-lo como bruxos da modernidade. Não se implica em nenhum dos erros flagrantes e poucas vezes pede desculpas por suas palavras e atos fora de qualquer parâmetro civilizatório. Nada de novo traz o Presidente à cultura política do País e ainda nos brinda com acusações e desrespeito a jornalistas no exercício de sua profissão, a mulheres e a homossexuais. Usa as redes sociais e inventou dois palanques, um virtual, a chamada “live”, e um de carne e osso na porta do palácio, residência oficial da presidência, que revive os velhos e tradicionais palanques usados pelos governantes populistas desde sempre. O palanquinho do palácio da Alvorada tem como público jornalistas do Brasil e do mundo e uma claque que ri dos impropérios que fazem parte da cultura machista e reacionária, antigamente jamais exposta em público. Em sua recente viagem à Índia, depois de participar de uma cerimônia em homenagem a Mahatma Gandhi, o líder pacifista da independência do país, ao ser perguntado sobre o que achava da personalidade histórica que uniu os indianos libertando-os e colocando-os como iguais no plano da Comunidade Britânica, o Presidente referiu-se em tom e sorriso irônicos: “Eu sou um capitão do Exército, ele é um pacifista. Mas, obviamente, a gente reconhece o seu passado, sempre pregando a paz, a harmonia e a liberdade”. Nem um pio sobre sua importância histórica. E de ato falho em ato falho o Presidente vai cavando sua desgraça. Tenho esperança de que o seu profundo desprezo pela civilização, baseada nos princípios do bem comum, da fraternidade e da busca pela igualdade, o leve rapidamente para o lugar dos derrotados.