Elas garantem que desconheciam a lei que obriga os turistas a fazerem uma reserva em um hotel, mesmo para uma escala de apenas um dia. As turistas Wilma, Jennifer Liliana ficaram cerca de um mês detidas na França Angélica Pérez/RFI As turistas Wilma, Jennifer e Liliana, a primeira venezuelana e as duas outras colombianas, pensavam passar apenas uma noite em trânsito em Paris. Mas ao desembarcar em julho no aeroporto internacional de Roissy-Charles de Gaulle, foram barradas pela polícia de fronteiras porque não apresentaram uma reserva de hotel na capital francesa. Seus passaportes foram confiscados e as três turistas latino-americanas enviadas para um centro de retenção ao lado do aeroporto, que ONGs denunciam como “prisões subterrâneas onde os direitos dos estrangeiros são desrespeitados”. As três turistas ficaram quase um mês detidas. Além dos passaportes, elas também tiveram as bagagens confiscadas. Em entrevista à reportagem da RFI, as três denunciam que foram tratadas como “prisioneiras” na “Zona de Espera ZAPI 3” do aeroporto. Elas garantem que desconheciam a lei que obriga os turistas a fazerem uma reserva em um hotel, mesmo para uma escala de apenas um dia. Jennifer, que teve um câncer diagnosticado há cinco anos, ganhou a viagem até Madri de presente de aniversário dos pais. A agência de viagem que vendeu as passagens na Colômbia não informou as exigências francesas para a escala em Paris, afirma a jovem. O mesmo aconteceu com Liliana, que também seguia de férias para a capital espanhola. “Me disseram que podia fazer escala em Paris e veja só o que aconteceu: fiquei 27 dias detida”, desabafa a colombiana. O destino final da venezuelana Wilma era a Suíça. Ele iria visitar o filho doente e também ignorava as regras para os turistas entrarem no território francês. Durante sua detenção, ela forneceu todos os documentos exigidos, mas só teve seu passaporte e bagagem de volta 21 dias depois. Cerca de 7 mil turistas detidos em 2016 As turistas não viajavam no mesmo voo e se conheceram na ZAPI 3. O aeroporto Roissy-Charles de Gaule recebe cerca de 90% dos viajantes que chegam à França. Em 2016, sua “zona de espera”, montada a alguns passos da pista de aterrissagem, reteve cerca de 7 mil pessoas que, segundo as autoridades aeroportuárias, não preenchem as condições para a entrada no território francês, como visto, passaporte em dia, reserva de hotel, seguro saúde e passagem de volta. Os turistas também devem apresentar justificativas de recursos financeiros, entre US$ 65 a 120 por cada dia de estada na França. Aeroporto Charles de Gaulle, na região de Paris, em imagem de arquivo Veronique Paul/ Reuters “As autoridades apresentam o ZAPI 3 como um hotel, mas na realidade todos os que estão ali, estão detidos. Tudo o que te priva de liberdade é uma prisão”, assegura Wilma. Ela diz que durante o tempo em que esteve detida, havia no local 120 pessoas na mesma situação que a dela e que muitos “barrados” eram originários de países latino-americanos. Os centros de retenção existem nas estações ferroviárias, aeroportos ou portos da França que recebem viajantes estrangeiros. Apesar de serem locais com dispositivos de ultra segurança e fechados ao público, eles não dependem da administração penitenciária e sim da polícia de fronteiras (DCPAF). ONGs como a Anafé, que defendem os direitos dos migrantes, acusam essas “Zonas de Espera de serem prisões com outro nome, que violam as liberdades dos estrangeiros e onde as expulsões são agilizadas.” Tratadas como criminosas As três mulheres denunciaram que não receberam nenhum tipo de ajuda ou assessoria durante o período de detenção. Ao contrário, só foram humilhadas. “Assim que você chega, você se sente um prisioneiro. Eles levam seu celular e todos os seus pertences. Nos dão produtos de higiene pessoal, um lençol e um cartão telefônico para que você possa se comunicar com a família”, conta Liliana. Mas para ela, o pior foi o tratamento ultrajante dos policiais. “Eles nos colocaram em uma masmorra, nos algemaram, nos intimidaram, nos forçaram a tirar a roupa, até mesmo as íntimas, tudo. Os policiais zombaram de nós ”, lembra ela, sem conter as lágrimas. As turistas foram “libertadas” somente em 11 de agosto, após uma decisão judicial. Mas o calvário delas estava longe de terminar. “Eles nos jogaram na rua e nos disseram para buscar nossos passaportes de volta na secretaria de segurança polícia de Bobigny. Nós não sabíamos onde era e estávamos do outro lado da cidade. Nós não tínhamos dinheiro e começamos a ir a pé. Nós andamos muito. Eu estava muito doente. Wilma pediu ‘carona’ e Liliana cuidou de mim”, descreve Jennifer. Encontraram pessoas solidárias que as ajudaram e finalmente nesta terça-feira (20) conseguiram recuperar os passaportes, para seguir viagem. Nenhuma das três tem a mínima intenção de permanecer na França. “Eles nos tratam como se fossemos realmente criminosos e acabamos nos perguntando: quem matei? Que fiz de ilegal? Como estou na França, não consigo parar de pensar no rótulo que eles nos dão aqui: ser latino-americano significa ser um imigrante ilegal ”. O pesadelo vivido pelas três mulheres pode acontecer com qualquer estrangeiro que a polícia suspeite de querer entrar na França ilegalmente.