A vida transformada por algum tipo de crime, começa a mudar de novo com o trabalho artesanal. Peças de porcelana, sabonete, crochê e até pneus produzidos por presos estão à mostra no Fórum de Campo Grande, desde ontem (8), e chamam atenção de pessoas que acreditam na segunda chance. São criações à venda para, a cada três dias de trabalho, seja menos um dia na cadeia.
“Para quem não conhece, existe preconceito em apoiar e dar uma segunda oportunidade. Muitos acham que não existe segunda chance, mas, quem somos nós para estar julgando? Já vi pessoas que agarraram a essa chance e hoje tem uma nova vida”, relata a representante comercial, Maria do Rocil.
Para ela, a redução da pena é um incentivo para os detentos mudarem de vida. “É fácil criticar sem saber o que existe por trás de cada trabalho. Sou a favor de diminuir a penalidade porque é um estímulo pra quem está lá na prisão. Dei uma segunda chance a uma ex-detenta, que hoje trabalha comigo e é uma das melhores funcionárias”, disse.
São várias peças artesanais expostas no pátio do Fórum. A mostra é gratuita e faz parte da décima edição da Feira Artesão Livre, em especial do Dia das Mães realizada pela Agepen (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário), em parceria com o Poder Judiciário e Ministério Público. O evento continua até sexta-feira (10), e conta com trabalhos de detentos do regime feminino e masculino.
Os trabalhos estão sobre algumas mesas e no chão do pátio do local. Tem pinturas, desenhos, além de camas pets produzidos com pneus de carros. O dinheiro que será arrecado com a comercialização deve repassado para quem produziu as peças.
Acadêmica de filosofia, Adelice Dias Ferreira Gomes esteve na exposição para acompanhar a filha que é estudante de direito. Contudo, aproveitou a ocasião para conhecer os artesanatos e afirma que o preconceito não deve impedir a oportunidade.
“As pessoas erram. É difícil para quem comete delito ter outra chance dentro da prisão. Ela é excluída, rejeitada. Concordo com a redução da pena, pois acredito que é um meio de descobrir algo, que está adormecido neles”, disse.
O aposentado, Wilson Santana, 70 anos, passou pela mostra, mas relatou que não gosta artesanato. Entretanto, achou diferente e acredita que o trabalho é uma maneira dos internos não ficarem “ociosos”. “Assim tem algo para fazer. Apoio a redução na pena, desde que estejam trabalhando. Todos merecem a segunda chance”, afirmou.
Ele comenta que recebeu uma segunda chance após ter três paradas cardíacas, há 13 anos. “Enfartei e o meu cardiologista me deu como morto. Fique dez minutos sem sinal de vida, ganhei outra oportunidade de viver e penso que todos merecem o mesmo”, falou.
Vendas – A chefe da divisão de trabalho prisional e agente penitenciária, Elaine Alencar conta que o dinheiro das vendas será repassado para os internos que produziram as obras. “Eles estabelecem os valores de cada peça, os trabalhos estão etiquetados informando o nome de quem fez. Faremos um balanço após a mostra e passaremos o valor”, disse.
“O dinheiro é para eles comprarem produtos básicos na cantina do regime ou entregaram para alguém, pois recebem visitas dos familiares nos finais de semana”, relata a agente. Elaine fala sobre os trabalhos. “Tem interno conseguindo reduzir a pena através do artesanato. A cada três dias de trabalho, é um dia a menos. Cada núcleo de produção tem um coordenador que é um servidor penitenciário e faz a intermediação da compra do material, e ensina técnicas”.
Ela comenta que os trabalhos em porcelana foram produzidos por um grupo de arte terapia, coordenado por uma psicóloga. “São internos em medidas de segurança, que a maioria tem problemas psiquiátricos”, fala.
Sobre a reação das pessoas ao descobrirem quem produziu as peças, ela diz. “Quando comunicamos que foi um interno, elas pensam que têm mais um motivo para comprar. Sentem-se responsáveis socialmente pela vida daqueles que estão presos. É uma forma também de aproximá-los do mercado de trabalho, porque o artesanato é uma profissão”, concluiu.
Fonte: Campo Grande News