São Miguel das Missões, no Rio Grande do Sul, abrigou a mais importante redução jesuítica existente no Brasil. Fundada em 1687, chegou a reunir, no auge, quase 5 mil habitantes, entre indígenas e religiosos. Após ser incendiado, restaurado e repovoado, o local acabou saqueado no início do século dezenove e viu seus moradores irem embora de vez. Hoje, as ruínas da redução são tombadas como patrimônio brasileiro e da humanidade e constituem o Sítio Arqueológico de São Miguel Arcanjo.
No local, uma construção se destaca pela relação de harmonia com o espaço onde está situada. O Museu das Missões foi construído no sítio arqueológico de forma a não concorrer com a magnitude da enorme igreja do século XVII que ali resiste. Inaugurado em 1941, o museu foi projetado pelo arquiteto e urbanista Lucio Costa e, desde 2009, é administrado pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), autarquia vinculada ao Ministério da Cidadania.
O objetivo do museu é comunicar, interagir e preservar o patrimônio cultural e natural relacionado com o território dos Sete Povos das Missões. A pequena unidade, composta por três galerias, acolhe a maior coleção de arte sacra missionária da América Latina e uma das maiores do mundo. O acervo é composto por cerca de 90 peças, entre esculturas em madeira com estilo barroco, peças em arenito e metais e os grandes sinos que pertenceram à igreja do local.
“Os visitantes vão encontrar uma diversidade enorme de peças sacras que foram confeccionadas, na maioria, pelos guaranis, sob orientação dos jesuítas, que eram as pessoas que dominavam a arte de esculpir”, explica o restaurador Ariston José Correia Filho, que dirigiu a instituição de 2007 a 2016.
Neste mês de fevereiro, o ministro da Cidadania, Osmar Terra, esteve no sítio arqueológico e assinou uma ordem de serviço para a requalificação urbanística do local. A expectativa é que as melhorias estimulem ainda mais o turismo no local. Mas mesmo sem as reformas, a visita às ruínas e ao museu já agradam os turistas.
“A história do local me chamou a atenção. Gostei de ver como tudo aconteceu e como viviam antes os índios guaranis e ver como eles se revoltaram”, destaca a professora argentina Bustamante Noelia, que visitou o museu acompanhado do marido e do filho.
O confeiteiro gaúcho Oséias Cleiton Teixeira da Silva, que mora há menos de 100 quilômetros do museu, visitou o local pela primeira vez neste mês. “Está sendo uma experiência única. O espaço é deslumbrante. As peças, as estátuas, tudo feito à mão, é diferente de tudo que a gente já viu”, afirma.
Namorada de Oséias, Nadiele Campos também elogiou o museu. “O espaço é maravilhoso, aconchegante. Traz muitas histórias para nós. O museu nos coloca algumas peças do que ficou, que foram restauradas. É tudo muito bonito. Muito diferente”, afirma.
Ao redor do Museu das Missões, descendentes dos índios guaranis vendem para turistas e visitantes o artesanato que produzem. Semanalmente, cerca de 10 indígenas se revezam para oferecer produtos como pulseiras, colares, chocalhos e flautas adornadas por penas e pinturas.
“Vivemos apenas do artesanato. Para quem é mais velho, é mais difícil conseguir emprego”, afirma o artesão guarani Mariano Anguirre, de 60 anos, que passou o dia todo à espera de interessados em seus produtos, ao lado de sua esposa, no gramado que cerca o museu.
Herói praguejado
Em uma edificação anexa ao museu, há a Casa do Zelador, que teve esta função até quase o início dos anos 2000. Nela, morou uma figura de extrema relevância para a existência do museu, o seu primeiro zelador, João Hugo Machado. Foi ele que, na década de 1940, recebeu a missão de buscar nas redondezas peças que haviam pertencido à Igreja e que foram tomadas pela população.
“Ele recebeu essa função e saiu a requisitar imagens e o que ele encontrou foram essas 80 peças, mais ou menos, que hoje estão no museu. O que tem de imagem ali foi ele quem trouxe de volta”, conta um de seus seis filhos, Carlos Machado. “Ele (meu pai) disse que foi o homem mais praguejado do mundo. Rogavam muitas pragas contra ele. Pra fazer isso aí que ele fez, só herói mesmo. Eu acho que não existia outra pessoa nessa região que tomasse conta de um trabalho daqueles”, conclui.
Seu Carlos, como é conhecido, também foi zelador do museu e, desde que se aposentou, cuida de uma loja de artesanato no local. “Desde guri, éramos nós quem cuidávamos (do museu). No começo, era a família com os filhos. A mãe e os filhos. Porque o meu pai saia atrás das imagens. Às vezes, ficava quatro, cinco dias fora, sem vir em casa. Quem tomava conta era a gente. Nós nos criamos ali dentro”, conta.
Tornado
Em abril de 2016, um tornado provocou danos às instalações físicas e a parte do acervo do Museu das Missões, o que levou a instituição a fechar as portas até setembro de 2017. Com recursos do Fundo Nacional da Cultura (FNC), foram investidos mais de R$ 1,68 milhão na recuperação das estruturas. Após a reabertura, uma das salas de exposição foi reservada para mostrar aos visitantes como funciona o processo em curso de tratamento das peças e da recuperação do acervo atingido.
Além da destruição das paredes de vidro das galerias, ao menos 10 obras de diferentes portes foram prejudicadas. Uma já foi restaurada, a do Cristo crucificado, que voltou a ser exposta. As peças que ainda precisam de restauro estão sendo tratadas em um local fora do museu, em um espaço cedido pela prefeitura local, onde foi construído um laboratório. “É um trabalho bem demorado e delicado. Cada peça possui uma particularidade diferente. Os principais danos se resumem a quebraduras e danos causados pelos estilhaços de vidro”, explica a estagiária de restauração Inaê Sfalcin, que apoia o diretor Ariston José Correia Filho neste processo.
Serviço
Endereço: Rua São Luis, S/Nº, São Nicolau – São Miguel das Missões – RS
Horário de funcionamento: terça a domingo, das 9h às 12h e das 14h às 18h. Durante o horário de verão, o museu fica aberto até as 20h.
Tel: (55) 3381-1291
Email: museu.missoes@museus.gov.br
Camila Campanerut
Assessoria de Comunicação
Secretaria Especial da Cultura
Ministério da Cidadania