Em entrevista à BBC News Brasil, funkeiro pede respeito ao ritmo e conta detalhes da gravação do 'hino da vacina' dentro do instituto paulista MC Fioti Fabio Tito / G1 O "Bum Bum Tam Tam" chegou ao Butantan. Agora, literalmente. Nesta sexta-feira (15), depois de alcançar quase 1,6 bilhão de visualizações do vídeo "Bum Bum Tam Tam" no YouTube, o funkeiro MC Fioti gravará uma nova versão do sucesso descrito como o "hino da vacina" nos corredores da sede do instituto Butantan, em São Paulo. Lançada em 2017, a música alçou o clipe do paulista de 26 anos aos 30 vídeos mais vistos da história do YouTube em todo o mundo. Nas últimas semanas, ela ganhou novo impulso com o avanço nos testes da CoronaVac, a vacina da farmacêutica chinesa Sinovac que está sendo desenvolvida no Brasil em parceria com o Instituto Butantan. O anúncio foi feito pelo próprio MC Fioti em entrevista vídeoconferência à BBC News Brasil. "Vamos fazer o novo clipe baseado no contexto original da Bum Bum Tam Tam", conta o funkeiro. "Na nova versão, o gênio dá três desejos: a gente vai pedir paz e saúde para a população e a cura para o coronavírus", revela Fioti. O vídeo original mostra uma paródia com referências ao clássico Mil e Uma Noites, incluindo um "gênio da lâmpada" concede desejos a MC Fioti e sua trupe, em uma espécie de harém. A letra foi atualizada para a nova gravação: "A vacina envolvente que mexe com a mente / de quem tá presente. A vacina saliente / vai curar muita vida e salvar muita gente. Vem cá vacina, tam / Vem cá vacina tam tam tam". "O nosso funk está se agregando à medicina e isso nunca aconteceu na história", diz o músico, que diz ainda tentar entender como a música acabou sendo associada à vacina. "Nós soubemos pelos memes." MC Fioti faz versão de 'Bum bum tam tam' após música virar 'hino' da Coronavac Apoio à vacina Em meio à polarização em torno da vacina, MC Fioti defende a imunização. "Fico muito feliz porque de alguma forma estou podendo ajudar através da música, com alegria, e incentivando as pessoas a tomar a vacina. Tem muita gente aqui no Brasil que fica em cima do muro, que não quer tomar a vacina e tal", diz. "Eu vou tomar. Com certeza." O governo de São Paulo anunciou em 12 de janeiro os resultados finais dos testes de eficácia da CoronaVac. De acordo o diretor de pesquisa do Instituto Butantan, Ricardo Palácios, os estudos apontaram que a eficácia geral da vacina é de 50,38%. O dado foi obtivo com testes feitos em 12.508 voluntários no país, todos profissionais de saúde. Segundo Palácios, os profissionais de saúde foram escolhidos porque têm uma exposição maior ao vírus. Esse dado é a taxa global de eficácia da CoronaVac, ou seja, os desfechos primários, que incluem todas as pessoas que ficaram doentes independentemente da gravidade da doença. Nenhum dos infectados precisou de internação hospitalar, informou o Instituto Butantan. Com base nesta série de resultados, o governo paulista e o Butantan enviaram à Anvisa o pedido de autorização para o uso emergencial e o registro definitivo da vacina no país. Uma decisão deve ser anunciada neste fim de semana. "Acredito que Bach ia amar" O que muita gente não não sabe é que a flauta que funciona como fio condutor de "Bum Bum Tam Tam" é um trecho alterado de uma melodia do século 18. Vem de Partita em Lá menor para flauta solo, composta pelo alemão Johann Sebastian Bach, a "flauta envolvente que mexe com a gente" descrita na letra do funk. À reportagem, MC Fioti descreve o funk como um ritmo diverso, fruto de influências que vão do rap norte-americano aos clássicos. Acima de tudo, diz o paulista, é "um ritmo nosso, brasileiro". "Às vezes, nós valorizamos uma música que é de fora e não valorizamos a nossa. O ator de fora e não o nosso. O diretor de cinema de fora e não o nosso. Então vamos começar a valorizar a cultura brasileira porque é isso nosso, a gente não pegou de ninguém." Aos críticos do ritmo, que associam o funk à violência ou ao sexo, Fioti pede para que "não julguem o livro pela capa". "Muitas vezes as pessoas não conhecem a história, não convivem com o estilo e querem falar pelo passado. Eu peço que parem de criticar, porque mudou a nossa vida e está mudando muitas vidas de jovens na periferia. Quantas pessoas trabalham com o funk hoje e levam o alimento para dentro de casa? Isso é errado? Isso salva vidas, tira do crime, tira moleque da rua", diz. "Você não precisa amar o funk. Só para de falar que ele não presta porque você está promovendo discórdia sobre um movimento que passa muito sufoco, sofre muito e aos poucos está vencendo", diz. "Eu entendo que tem as letras de ousadia e as letras conscientes. E tem também a realidade, o 'proibidão' que eles chamam. Não é porque você não gosta da música de ousadia que não vai gostar da consciente. Não é só porque nessa aqui fala "bumbum" que você tem que desprezar o contexto todo." O MC relembra como transformou os acordes originais de Bach em funk. "Escuto muitos estilos de música para ter ideias e samplear. Foi através do (rapper norte-americano) Dr. Dre que conheci o Bach. Ele já sampleou Sebastian Bach. Eu falei: caramba, quem é Sebastian Bach? Peguei o nome dele e pesquisei no YouTube e comecei a ver as partituras. E foi aí que achei a de 'Lá menor'. Achei a flauta, tive a ideia, baixei o arquivo, sampleei e criei a letra. Foi de momento. E essa flauta mudou minha vida", lembra. Como Bach reagiria à nova versão? "Pelo sucesso que foi, eu acredito que ele ia amar, ia gostar, ia achar legal. Acredito que sim." Perfil: MC Fioti "Começo a chorar" Nascido em Itapecerica da Serra e criado nos arredores do Capão Redondo, na periferia de São Paulo, MC Fioti conseguiu resgatar os acordes do autor clássico alemão para além dos bailes funks brasileiros – pessoalmente, ele se apresentou em pelo menos 14 países europeus. Nas últimas semanas, com o novo boom gerado pela associação de sua música mais famosa ao nome do instituto responsável pela vacina CoronaVac no Brasil, viu um salto de 284% na procura pela canção na plataforma de streaming Spotify. De carona, uma versão da música gravada por membros da Orquestra Sinfônica da Bahia voltou a viralizar. A reportagem pergunta como o jovem se sente. "Muito grato. Eu vim da periferia. Minha mãe cuidou de mim e dos meus irmãos sozinha. Ela sempre trabalhou de empregada doméstica, sempre sofreu. Também sofria agressão doméstica pelo pai dos meus irmãos. Então eu consegui mudar a história da minha mãe e da minha família", diz o funkeiro, emocionado. "O que me faz mais feliz é que hoje não falta nada na minha família, na mesa, e minha mãe não precisa mais trabalhar. Eu não tenho nem palavras, se começar eu começo a chorar. De verdade. A história é linda mas também é triste."