Sem estratégia clara para melhora das contas públicas e com a redução de incentivos concedidos neste ano, não há um motor claro para recuperação vigorosa do PIB do ano que vem. PIB 2021: consumo foi motor do crescimento em 2020, mas auxílios serão retirados na virada do ano e impulso na economia terminará de uma só vez Divulgação/Magazine Luiza A alta de 7,7% do PIB brasileiro no 3º trimestre e a expansão projetada para o período seguinte não devem afastar o Brasil de um cenário de crescimento tímido em 2021. As projeções do boletim Focus, do Banco Central, estimam alta de 3,45% para o PIB do ano que vem, após uma queda em torno de 4,5% em 2020. Boa parte desse número é o que se chama de carrego estatístico — a herança que fica do desempenho positivo da atividade deste ano para o próximo. Economistas procurados pelo G1 estimam que o carrego deve variar de 2% a 3%, e elencam uma série de incertezas que dificultam uma retomada mais robusta da atividade econômica. A principal delas é a dúvida quanto a resolução da crise fiscal do país, além do suporte à população em momento de saída de crise sem furar o teto de gastos. Risco fiscal: entenda o que é e saiba por que a piora das contas públicas preocupa e pode atrapalhar a retomada da economia O teto se tornou uma espécie de âncora fiscal para o mercado, pois impede o crescimento das despesas acima da inflação do ano anterior. Sem ele, a percepção de risco pode dos investidores com o Brasil tende a piorar, o que pode provocar uma saída ainda maior de investidores, desvalorização ainda maior da taxa de câmbio e aumento de juros. “O risco é de baixa para a atividade. A gente vê essa agenda fiscal escorrendo cada vez mais para 2021. O país entra em 2021 com um nível de incerteza mais alto.”, afirma Alessandra Ribeiro, economista e sócia da consultoria Tendências. PIB anual Economia G1 Parte dos economistas defende uma remodelação do conceito do teto de gastos, abrindo espaço para investimentos e assistência social em momento de crise. Isso porque, na virada do ano, seria necessário um aporte mais robusto do governo para substituir ou diminuir aos poucos a injeção de recursos garantida pelo Auxílio Emergencial, que deu energia à demanda e amorteceu a queda do PIB ao longo de 2020. Criado para reduzir os efeitos da pandemia no orçamento das famílias, o auxílio se revelou o principal motor de crescimento da economia neste ano e turbinou o consumo das famílias mesmo em um ano de crise. A ajuda representou uma injeção de recursos de cerca de R$ 330 bilhões na economia – cerca de R$ 50 bilhões ao mês quando eram pagas as parcelas de R$ 600. O valor é bem mais expressivo do que o do Bolsa Família, que custa cerca de R$ 35 bilhões ao ano e beneficia 14 milhões de famílias. Nas contas da Tendências, uma ampliação do Bolsa Família, com tíquete médio de R$ 300 e atendendo 17,5 milhões de famílias, faria com que o governo precisasse "achar" R$ 30 bilhões no Orçamento do próximo ano. “O maior desafio de 2021 é tirar recursos de dentro do orçamento para financiar essa ajuda. [O fim do Auxílio Emergencial] É uma retirada de apoio à demanda muito significativa. Não vejo outro motor da economia capaz de substituir esse impulso fiscal”, diz Elisa Machado, economista-chefe da ARX Investimentos. Miriam Leitão: renúncias fiscais podem ser opção para financiar o Renda Cidadã Mais do mesmo Já no início de dezembro e ainda sem clareza sobre um plano de ação — ou eventual impulso à economia —, o cenário à frente se torna ainda mais turvo e reduz expectativas de um crescimento que surpreenda. “O ano de 2021 já começa com um nível de PIB mais alto do que a média de 2020. Se a economia não crescer ao longo de 2021, a taxa de crescimento do PIB já vai estar em torno de 2,5%.”, diz o economista-chefe da BlueLine Asset Management, Fabio Akira. Procurado para comentar os planos para 2021, o Ministério da Economia não concedeu entrevista. Mas são dois passos que o governo espera, no curto prazo, para dar um norte à situação: o envio do Orçamento de 2021 (com um programa social possivelmente inserido) e a aprovação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) com mecanismos de controle de despesas públicas para União, estados e municípios, a chamada PEC Emergencial. Se aprovada, a PEC pode permitir, por exemplo, que o governo reduza a jornada de trabalho e o salário de servidores públicos, abrindo mais espaço tanto para um programa social como para outros manejos dentro do Orçamento. A economista Luana Miranda, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), espera essa sinalização dos planos do governo para repensar as projeções de crescimento para o ano que vem. "O ideal seria deixar claro que há uma forma de reduzir gastos obrigatórios, especialmente com funcionalismo. Se a sinalização fiscal for muito ruim, o Banco Central terá que subir juros antes do imaginado e a situação fiscal sofrerá ainda mais deterioração", diz Luana. O Ibre/FGV espera um crescimento de 3,5% para 2021. A trajetória da dívida pública, hoje por volta dos 95% do PIB, e respeito ao teto serão determinantes para que o número não seja menor. Análise: os números do desemprego e as perspectivas para 2021 O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, lembra que, mesmo com os ajustes feitos, há ainda um peso enorme contra o crescimento pelo lado da demanda, em consumo e investimentos. A consultoria espera apenas 2,2% de crescimento para 2021. Vale afirma que, ainda que o saldo do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) possa fechar o ano de 2020 em campo positivo, a sondagem do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra uma taxa recorde de desemprego no país. Além de diminuição da massa salarial do brasileiro, quem está empregado e vê o cenário difícil do mercado acaba retraindo o ímpeto de consumir. Já para o investimento, o economista lembra que a capacidade ociosa da indústria ainda é bastante elevada e a desvalorização do real frente ao dólar inibe a compra de equipamentos e ampliação de fábricas. "Por mais que se tenha novos marcos regulatórios, como a Lei do Saneamento, e haja concessões acontecendo, são movimentos que levam um tempo para surtir efeito", afirma Vale. Além disso, diz ele, o Brasil tem passos a evoluir na segurança jurídica de parcerias público-privadas. Um exemplo marcante é a decisão da Justiça de negar a devolução da concessão da Linha Amarela no Rio de Janeiro à empresa Lamsa. A Prefeitura do Rio, desgostosa com as taxas cobradas como pedágio, pediu o cancelamento da concessão. O Supremo Tribunal Federal confirmou, em outubro, a posição do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que deu ganho à Prefeitura. "Podemos ter dificuldades para outros investidores. Quem vai investir no país que volta a ter essas questões que pareciam estar adormecidas, de intervenção nas concessões?", diz. Initial plugin text VÍDEOS: Últimas notícias de Economia