Apresentada em 'Um show só', a canção '2 de junho' expõe a ferida social que tirou a vida do garoto de cinco anos. ♪ Nascido em Vitória de Santo Antão (PE), cidade do interior de Pernambuco, Miguel Otávio Santana da Silva (17 de novembro de 2014 – 2 de junho de 2020) era menino cheio de vida que vivia a sorrir e a brincar como qualquer criança. Até que, em 2 de junho, dia em que a regulamentação do trabalho doméstico no Brasil completava cinco anos, Miguel Otávio perdeu a vida e o sorriso quando também tinha cinco anos. Nessa data, Miguel morreu ao cair do nono andar do prédio do Recife (PE) em que a mãe, Mirtes Renata Santana de Souza, cumpria expediente como empregada na casa de Sari Mariana Costa Gaspar Côrte Real. A queda foi resultado da negligência da patroa no cuidado com o filho da empregada. Em agosto, dois meses após a morte de Miguel, Adriana Calcanhotto traduziu a revolta e a indignação do Brasil com o caso ao compor a música 2 de junho. “Levei o mês de agosto inteiro escrevendo essa música 2 de junho. Nunca uma canção foi tão dura de ser feita para mim, nunca tive esse tipo de emoções e sentimentos durante uma composição”, confidencia Calcanhotto. Capa do single '2 de junho', de Adriana Calcanhotto Murilo Alvesso Apresentada em 5 de setembro no roteiro de Um show só, espetáculo inspirado no álbum Só (2020) e transmitido online do palco do Teatro Riachuelo no Rio de Janeiro (RJ), a canção 2 de junho impactou o público que assistiu a Um show só pela letra evocativa das narrativas épicas de Bob Dylan. Letra sem rima e sem poesia que toca na ferida ao expôr a tragédia social do Brasil sob o prisma desse caso chocante. Captado na apresentação, o registro áspero de 2 de junho – feito por Calcanhotto somente com a voz e o toque da guitarra da artista – ganha edição em single programado para chegar ao mercado fonográfico em 18 de setembro, antecedendo a disponibilização integral de Um show só em data ainda incerta. A renda dos direitos autorais do single 2 de junho será revertida para o Instituto Menino Miguel, criado no Recife (PE) sob a égide do cuidado humano com crianças, adolescentes e pessoas idosas. ♪ Eis a letra da música 2 de junho, de Adriana Calcanhotto: “No país negro e racista No coração da América Latina Na cidade do Recife Terça feira 2 de junho de dois mil e vinte Vinte e nove graus Celsius Céu claro Sai pra trabalhar a empregada Mesmo no meio da pandemia E por isso ela leva pela mão Miguel, cinco anos Nome de anjo Miguel Otávio Primeiro e único Trinta e cinco metros de voo Do nono andar Cinquenta e nove segundos antes de sua mãe voltar O destino de Ícaro O sangue de preto 2x As asas de ar No país negro e racista No coração da América Latina”