
Cantora perdeu João Gilberto, Miúcha e um grande amigo entre 2018 e 2019. Ao G1, Bebel fala sobre disco com 'clima de 007', Billie Eilish e antigas desavenças familiares. Os últimos anos não foram fáceis para Bebel Gilberto. Primeiro, ela perdeu o grande amigo Mário Vaz de Mello, depois a mãe Miúcha e, seis meses depois, se despediu do pai João Gilberto em julho de 2019. A cantora diz que ainda não processou as perdas e que está "enrolando" para senti-las. Prefere se dedicar aos cuidados e chamegos com a nova companheira Ella, uma shih tzu de quatro meses, e ao trabalho, com o lançamento do disco "Agora" nesta sexta (21). O álbum com 11 faixas é o primeiro de estúdio em seis anos. Envolvida com outros trabalhos e com as vindas ao Brasil para cuidar da família, a cantora não acha que demorou muito tempo entre lançamentos. "Hoje em dia, acho que fazer disco quando a gente está sem compromisso é assim mesmo. A gente vai se encaixando", diz Bebel em entrevista por vídeo ao G1. As músicas foram escritas por Bebel em parceria com o amigo de longa data, músico e produtor Thomas Bartlett, que já trabalhou com Norah Jones, Florence + The Machine e Yoko Ono. A única participação é de Mart'nália na faixa "Na Cara". Os encontros no estúdio de Bartlett, que ficava a duas paradas de metrô da casa da cantora em Nova York renderam 17 músicas, mais até do que o álbum. "O som, os arranjos têm uma atmosfera que já remete uma coisa meio cinema, filme." "A gente tava nesse clima do '007' mesmo e que me permitiu ser um pouco atriz, ser um pouco brincalhona, um pouco ousada", afirma a cantora, citando o filme. "Eu vejo muito esse disco inteiro como várias trilhas sonoras. Sinto que é como se fosse uma viagem e foi isso o que quis criar realmente." Ella é companheira de Bebel Gilberto no Rio; na foto, ela posa ao lado de CDs e edições em vinil do disco 'Agora' Reprodução/Instagram/Bebel Gilberto Ao entrar nesse universo onírico e sussurrado, este último sua marca registrada, Bebel fala de Billie Eilish e do pop ASMR. Ela diz que escuta a jovem cantora todos os dias. "São coisas assim que você fala como é que uma menina tão jovem possa ter tão 'deepness', possa ser tão profunda. É realmente absurdo o som dela, acho um barato", afirma. "Acho engraçado as mães preocupadas achando que ela pode ser uma má influência. Uma coisa meio dark é meio bom também… Vai ficar falando de chiclete, de pirulito para o resto da vida? Ou que brigou com o namorado? Não, dá uma sofrida de verdade" diz ela, rindo. Maturidade e fuga do rótulo Bebel Gilberto lança 'Agora' Divulgação/Heidi Solander Bebel descreve o disco como o mais íntimo e confessional da carreira: "Fui um pouco mais madura, um pouco mais maluca, um pouco mais atriz que mora dentro de mim. Sem ser a fofinha, sem ser a princesinha". MAURO FERREIRA: Bebel Gilberto se enfraquece na rota sem cor da viagem reflexiva de 'Agora' Quando questionada se vê que o álbum segue a linha da bossa nova eletrônica em que é colocada desde o primeiro disco de sucesso internacional "Tanto Tempo" (2000), a cantora desabafa em tom de brincadeira: "Eu fico perguntando para mim mesmo 'Venha cá quando que eu vou ter o PhD dessa história de bossa nova? Eu já virei a Bebel, com som de Bebel, com cara de Bebel, pô". "Será que nos próximos 50 anos da minha vida, se eu chegar lá, eu vou conseguir fugir desse fantasma da bossa nova? Pelo amor de Deus", diz ela, rindo de novo. Ela reconhece a importância do que o pai construiu na música brasileira e vai além: "Papai criou uma estética, um jeito de pensar, um jeito de cantar, tantas coisas maiores que apenas a bossa nova, com todo respeito à bossa nova, que eu fico assim, às vezes, de saco cheio de ficar sendo tão associada a isso." Fim do silêncio João Gilberto e Bebel Gilberto Acervo Pessoal As brigas de família envolvendo questões financeiras e jurídicas em respeito à vida e obra de João Gilberto foram destaque na imprensa nos últimos anos de vida do cantor. Bebel entrou com processo para interditar o pai em 2017 e não costumava comentar o caso com a imprensa. Tudo mudou neste mês, quando ela quebrou o silêncio para dar a sua versão da história. "Foi uma decisão minha mesmo, eu não aguentava mais", afirma. "Hoje em dia acho importante que as pessoas entendam minha posição que era querer cuidar do meu pai". "Eu não estava brigando com ninguém, não tinha fortuna nenhuma, eu não estava querendo ser inventariante, ser representante", continua. "Eu quero que a música do meu pai seja muito ouvida, estudada, espalhada." A advogada Silvia Galdeman foi indicada para cuidar do inventário e Bebel espera que a decisão se mantenha. "Espero que a doutora Silvia continue nessa posição e que todos realizem que isso é o mais importante no momento". 'O que não foi dito' Bebel conseguiu colocar o que sentiu em relação ao processo de 2017 na música "O que não foi dito". É uma carta para o pai em que canta: "Na outra metade da vida / Você soube, fez tudo / Mas nessa metade, vou ter que tentar te ensinar". "Foi feita quando eu ganhei a curatela. Tinha saído umas matérias muito agressivas, muita exposição na imprensa, quando na verdade era um assunto de família que não deveria ser divulgado", ela lembra. Bebel Gilberto postou uma foto com João Gilberto e Miucha no Dia dos Pais de 2020 Reprodução/Instagram/BebelGilberto Depois de quase 30 anos, Bebel deixou os Estados Unidos há dois anos e voltou para o Rio de Janeiro. Hoje mora em um apartamento quarto e sala no mesmo prédio em que sua mãe morava no Leblon. "Moro na esquina na casa do meu pai e ele não tá mais aqui. Penso que pena que só morei aqui agora. Mas eu nunca ia imaginar que estaria nesse apartamento, nesse prédio, foi tudo uma coincidência", explica. Na entrevista, ela se diz uma pessoa muito espiritual e sente a presença dos pais, principalmente quando Ella começa a latir insistentemente olhando para um canto específico da casa. Isso aconteceu no dia anterior da entrevista ao G1. "Eu já estou convencida que são eles. Eles vieram visitar a gente. Eu sempre dou uma rezadinha de noite, sinto que eles estão perto." Bebel Gilberto sobre o pai, João Gilberto: 'O que importa é o que ele deixou'