Decisão acelera tramitação do projeto; não há data definida para votação. Artistas como Gilberto Gil, Caetano Veloso, Milton Nascimento e Djavan encabeçam campanha contra proposta. A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira (13), por 350 votos a 19, o requerimento de urgência do projeto que isenta órgãos públicos e entidades filantrópicas do pagamento de direitos autorais pelo uso de obras musicais em eventos.
Na prática, a aprovação acelera a tramitação do projeto. Ainda não há, contudo, uma data definida para a votação do texto.
Diversos músicos, entre os quais Gilberto Gil, Caetano Veloso, Milton Nascimento, Djavan e Paula Fernandes, encabeçam uma campanha contrária à votação da proposta.
Em um vídeo divulgado, os artistas argumentam que os direitos autorais são direito intelectual privado do compositor e questionam a pressa do Poder Legislativo em debater o assunto em meio à pandemia do novo coronavírus.
Os direitos autorais são pagos ao Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), que faz o repasse aos autores e compositores.
A proposta chegou a ser incluída no relatório de duas medidas provisórias (MPs), votadas recentemente pela Câmara. No entanto, diante da polêmica sobre o tema, acabou retirada das MPs mediante um acordo para que um projeto de lei fosse votado.
O projeto
O projeto é de 1997, mas, desde então, 58 propostas semelhantes passaram a tramitar em conjunto e ampliam a isenção do pagamento para outros setores, como hotéis.
Caberá ao relator, ainda não designado formalmente, elaborar um texto final para ser votado no plenário da Câmara.
Autor do requerimento de urgência, o deputado Newton Cardoso Junior (MDB-MG) argumentou que o setor hoteleiro está “quebrado” em razão da pandemia e que “será o último a retomar patamares no mínimo aceitáveis”.
O deputado Giovani Cherini (PL-RS) foi na mesma linha e defendeu que igrejas também sejam isentas de pagamento. "Realmente, a pandemia pegou os artistas, mas pegou os hotéis também. (…) Sinceramente, é um absurdo uma igreja fazer uma reunião e ter que pagar o Ecad. Qualquer reunião com 10 pessoas tem que pagar Ecad”, criticou.
Partidos de oposição como PT, PSOL, PSB, PCdoB, Rede e PV, se posicionaram contrariamente à votação do projeto neste momento. Líder da minoria na Câmara, o deputado José Guimarães (PT-CE) disse que a isenção do pagamento iria atingir o setor cultural, bastante impactado pela crise.
A deputada e líder da Rede na Câmara, Joenia Wapichana (Rede-RR), disse não ver urgência na votação do projeto. Segundo ela, a proposta pode prejudicar o setor cultural.
“Esses profissionais que vivem desse sistema de direitos autorais merecem ser ouvidos e ter os direitos garantidos. Não vejo urgência neste período de pandemia para discutir uma matéria tão complexa e importante também para o setor de cultura”, afirmou.
Reação de artistas
A articulação para colocar o projeto em pauta gerou repercussão negativa entre a classe artística. O vídeo com a participação de vários artistas criticando a votação começou a ser compartilhado nos últimos dias nas redes sociais.
"O projeto de lei 3.968 é de 1997. Por que ele seria urgente? Isso não faz o menor sentido", questionou o cantor Lenine no vídeo.
"O direito autoral não se paga com dinheiro público, não se trata de dinheiro público. É um direito privado, um direito do compositor", disse Caetano Veloso, que também participou da campanha.
Também houve reação dos artistas quando, na quarta-feira da semana passada (5), o deputado Ismael Bulhões Junior (MDB-AL), que presidia a sessão, anunciou que o requerimento de urgência seria o primeiro item a ser analisado na sessão seguinte.
O trecho do vídeo em que Bulhões prometia a votação começou a circular nas redes sociais, sendo compartilhado por diversos artistas, entre eles, a cantora Anitta.
"Conseguimos com nossa força tirar o assunto de pauta no início da pandemia. Pensaram que tivéssemos dormido e começaram novamente. Estamos atentos e vamos cobrar”, escreveu a artista no último dia 6. “Não é só sobre mim, dezenas de famílias vivem dessa forma de sustento. Nossos políticos não podem continuar fazendo manobras de próprio interesse que desvalorizam os artistas (famosos ou não) do nosso país", completou.
A manifestação da cantora fez com que o deputado se justificasse, também por meio das redes sociais, e negasse ser a favor do projeto.
“Não votarei favorável em nenhum momento do trâmite dessa matéria, nem no regime de urgência, nem muito menos na apreciação do mérito”, disse Bulhões em vídeo. “A classe artística tem sido uma das mais prejudicadas durante a pandemia”, afirmou.