Para analistas consultados pelo G1, fim de programas como Auxílio Emergencial e BEm somados à abertura econômica vão sobrecarregar busca por vagas. Projeções apontam para desemprego de até 18% no final do ano. Trabalhador segura carteira de trabalho Amanda Perobelli/Reuters O fechamento de vagas de trabalho ficou abaixo do esperado em junho – mas isso não significa que o mercado de trabalho tenha absorvido os efeitos da pandemia do novo coronavírus. A opinião é de quatro economistas consultados pelo G1 a respeito do resultado do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) para o mês de junho. Segundo a Secretaria de Trabalho do Ministério da Economia, o Brasil perdeu apenas 10,9 mil vagas formais de trabalho no mês passado, contra projeções que davam conta de um corte de 10 vezes mais postos de trabalho. Ainda assim, o semestre fechou com recorde de 1,2 milhão de postos eliminados durante a crise. Brasil fecha 1,19 milhão de vagas de trabalho no primeiro semestre de 2020 Os números de desemprego também ficaram aquém do esperado. A taxa oficial de desemprego no Brasil subiu para 12,9% no trimestre encerrado em maio, atingindo 12,7 milhões de pessoas, com um fechamento de 7,8 milhões de postos de trabalho em relação ao trimestre anterior. A desaceleração do Caged de junho, contudo, tem o apoio de programas governamentais com data para terminar. Soma-se a isso o efeito do Auxílio Emergencial, que compensou as perdas na massa salarial da população. Geração de empregos formais no primeiro semestre de 2020 Economia G1 Influências positivas Segundo os economistas ouvidos pelo G1, os números de junho foram beneficiados por três fatores: Primeiro, os especialistas observam sucesso do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (BEm), que permite a suspensão do contrato ou redução da jornada de trabalho para que o empresário evite demissões. Foram 15 milhões de acordos firmados, números que poderiam ter sido despejados nos dados de desemprego. Segundo, parte do setor de serviços ainda funciona com limitações. De portas fechadas (ou apenas entreabertas) por conta das medidas de isolamento social para combate do vírus, trabalhadores que perderam o emprego ainda não se dispuseram ou não vislumbram oportunidades para procurar uma nova vaga. Pela metodologia de emprego do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), só é considerado desempregado o indivíduo sem ocupação e que tenha procurado trabalho no último mês. O terceiro fator é o Auxílio Emergencial. Com a renda extra transferida pelo governo, há quem prefira se preservar da procura por emprego ou faça bicos informais para não perder o benefício. Para muitos trabalhadores de baixa renda, o benefício não só compensa o salário recebido pelo trabalho, como por vezes ultrapassa o montante. Mercado de trabalho formal apresenta melhora em junho Problemas à vista O grande gargalo para o futuro do mercado de trabalho é que todos os fatores que geram benefícios nos últimos meses têm data para acabar. Cessados os repasses do Auxílio Emergencial e feita a reabertura da economia quando os números da pandemia permitirem, a busca por emprego deve subir imediatamente. Renda menor, contas atrasadas e conformismo: os impactos da redução de jornada ou suspensão de contrato “A sensação é que, de fato, o fundo do poço passou. Mas isso não significa que a taxa de desemprego vai começar a cair”, afirma o economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo. “Pelo contrário. A taxa de desemprego vai subir porque as pessoas não estão procurando emprego por causa do isolamento social”, afirma Camargo. “As pessoas já estão desempregadas, só que elas não estão procurando emprego e, portanto, não aparecem na estatística como desempregadas”. Pelas projeções da Genial, a taxa de desemprego deve encerrar este ano próxima de 18% – mais de 5 pontos percentuais acima dos 12,9% de maio. Brasil fecha 1,19 milhão de vagas de trabalho no primeiro semestre de 2020, diz governo A economista-chefe da ARX Investimentos, Solange Srour, acredita ainda que mudanças estruturais devem atingir o mercado de trabalho ao fim da pandemia. A redução da presença física em escritórios, por exemplo, deve impactar rendimentos de serviços que dependem da circulação de pessoas para sobreviver. É um baque que se espera em áreas como comércio, restaurantes, transportes e demais serviços cuja mão de obra é mais barata e pouco qualificada. Adoção maior de tecnologia também deve afetar viagens a trabalho e hotelaria. "Há realocação de setores mais tradicionais para mais tecnológicos. A pandemia trouxe uma mudança permanente na forma de produzir e consumir, que são poupadoras de mão de obra e utilizam um trabalho mais qualificado.", diz. Para Solange, o pouco espaço fiscal não permite subsidiar por mais tempo as medidas atuais, ainda que tenham dado certo em momento de emergência. A estimativa da ARX é um aumento para 16,5% nos dados de desemprego. Ana Flor: Governo comemora dados de emprego, mas ainda espera piora nos números "Ainda que se tenha outro programa de incentivo, se for nos moldes de manter vivo o teto de gastos, não vai gerar uma renda adicional significante. E essa queda da renda vai interferir no consumo e crescimento." Na avaliação do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), há duas preocupações com o futuro do emprego no país. O instituto também estima que o desemprego vai crescer até o fim do ano: 13,1%. Do lado dos informais, os números do mercado de trabalho devem ser pressionados no momento em que esse contingente voltar a procurar emprego. Entre os formais, há ainda a dúvida sobre a disposição de patrões que requisitaram suspensões de contrato em manter o corpo de funcionários quando o período de carência terminar e estiverem liberados para demitir. “Quando o programa acabar, existe uma dúvida se o empresário vai estar com fôlego para sustentar a folha que pagamento”, afirma o economista do Ibre/FGV Rodolpho Tobler. “O que a gente tem visto é que há uma incerteza muito grande.” A MB Associados projeta um salto para 17% no contingente de desempregados. A consultoria vê com preocupação a falta de reação dos grandes empregadores, dado que o puxador do PIB neste ano, deve ser o agronegócio – que emprega pouco se comparado à indústria e serviços. "É uma economia que está com uma queda forte de PIB, muitas empresas em recuperação judicial ou fechando", diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. "Os pequenos negócios que perdemos vão gerar um contingente grande de pessoas que não conseguem se recolocar."