Cantor preparou álbum em 2019 pensando em aliviar tensão das eleições americanas. 'Queria me preparar com músicas positivas para amplificar o otimismo', diz ao G1. Jason Mraz vive na fazenda Mranch, na Califórnia, onde planta café, abacates e outros alimentos Reprodução/Instagram/JasonMraz Jason Mraz, autor de hits como "I'm Yours" e "93 Million Miles", se divide entre a música e a plantação de abacate e café em sua fazenda Mranch, nos Estados Unidos. Apesar de respirar um ar menos poluído, a vida continua agitada para o cantor americano. Tanto que para o lançamento de "Look For The Good", disco de reggae lançado em junho, ele fez a entrevista no meio da plantação colhendo café. O álbum foi produzido antes da pandemia do novo coronavírus e tinha o objetivo de aliviar outra tensão: as eleições americanas. "Queria me preparar com músicas positivas para amplificar o otimismo e trazer luz para ideias que eu acredito, como igualdade, alegria e liberdade", diz Mraz ao G1, por telefone. A vontade de viver perto da natureza é mais antiga que os hits de 2008. Ele comprou e se mudou para o espaço em 2004. "Queria estar perto da natureza, longe das luzes da cidade, plantar minha própria comida, trabalhar com a terra e ser um artista bom, um cidadão bom, essas coisas", explica. Ele tem um estúdio em casa e foi de lá que captou os sons de pássaros que abrem a faixa "Take the music", por exemplo. Mraz explica as músicas com mensagem positiva de "Look For The Good" e fala os motivos para doar todo o lucro do disco para organizações sem fins lucrativos, como Black Lives Matter, na entrevista abaixo. G1 – Qual é a história por trás desse álbum? Quando você começou a trabalhar nele? Jason Mraz – Eu sabia que 2020 seria um ano eleitoral muito engajado e potencialmente negativo, então eu pensei: vamos colocar para fora algumas músicas positivas para amplificar o otimismo que é preciso para combater a negatividade de um ano eleitoral. Não antecipei que o ano seria tão ruim, como está sendo, mas eu queria me preparar com músicas positivas para amplificar o otimismo e trazer luz para ideias que eu acredito, como igualdade, alegria e liberdade. G1 – Você falou sobre positividade, alegria, amor. É essa então a mensagem que você quer passar com o álbum? Jason Mraz – Estar na Terra é um milagre e nós gastamos nosso tempo brigando por recursos, por idéias absolutamente ridículas. Todo artista, toda pessoa criativa, toda pessoa apaixonada sabe disso e, infelizmente, vivemos em um mundo com o capitalismo que é uma fome, é uma doença para dominar o mundo, buscar recursos e deixar outras pessoas de fora. É um problema doentio que temos. Espero que, com este álbum, continue a aumentar a conscientização de que não precisamos viver assim. Podemos compartilhar nossos recursos, nosso tempo aqui. Podemos cuidar melhor do planeta, podemos cuidar melhor um do outro. Não é tão difícil, mas como temos pessoas tão más e confusas neste planeta, o coração delas precisa estar aberto, sabe? G1 – Eu imagino que sim, mas quero confirmar: você é uma pessoa que sempre tenta ver o lado bom, encontrar o que as pessoas têm de bom, como canta na música "Look for the Good"? Jason Mraz – Absolutamente. Eu só escrevo sobre o que eu sei, sobre quem eu sou e, no limite, sobre quem eu quero ser. Eu quero olhar e procurar as coisas boas dos outros, mas algumas vezes eu esqueço e sinto raiva. G1 – Como todo ser humano… Jason Mraz – Sim, então eu sento, começo a tocar música e isso me traz alegria e esperança, me faz lembrar que sou um criador poderoso. Eu posso pegar um nada e transformá-lo em algo. Então isso me dá esperança e me faz procurar sempre o bem. Um exemplo é que podemos estar em uma sala silenciosa, mas se começarmos a cantar esse lugar se enche de beleza. A gente pode ir do nada para algo instantaneamente. G1 – Em "Gratitude", você agradece pessoas que fizeram coisas boas, mas também coisas ruins como quem fez bullying quando você tinha 17 anos. É bonito, porque algumas vezes não é fácil perdoar pessoas que nos machucaram… Jason Mraz – Se você vai buscar o bem, se isso vai ser um estilo de vida, você precisa perdoar de alguma forma. Não é fácil, mas o importante é não ficar guardando, não ficar segurando toda aquela dor, trauma e tristeza. Acho que tem um jeito de perdoar e esquecer e não seguir com isso pelo resto da vida. G1 – De onde veio a ideia de ficar ainda mais próximo do reggae? Jason Mraz – O produtor Michael Goldwasser me procurou para fazermos um disco de reggae juntos. Começou como um experimento para a gente ver o que acontecia e muito rapidamente vimos que as músicas eram boas, a banda era boa, o som era bom. A gente sabia que todas as músicas seriam reggae, mas era importante para gente também que elas soassem diferente. Então tem reggae mais clássico, mas também algumas coisas de rocksteady, ska, roots e dub. G1 – O lucro de "Look For The Good" vai ser destinado para instituições sem fins lucrativos. Você disse que essa não é a sua primeira doação na vida, mas que dessa vez decidiu torná-la pública. Por quê? Jason Mraz – Eu queria chamar atenção para a questão de que o capitalismo é uma doença. Sendo assim, eu não posso capitalizar essas músicas e cantar sobre a ideia de que nós podemos ser iguais, de que podemos ter liberdade e alegria sem contribuir para igualdade. "Seria como falar 'a gente tem que fazer alguma coisa', mas não fazer nada. Eu não posso cantar sobre mudança, sem fazer alguma mudança no mundo." G1 – Com a pandemia, todos os shows e turnês foram cancelados. Isso impactou muito a sua renda? Jason Mraz – Sim, com certeza. Eu pago as pessoas que trabalham para mim, minhas contas na fazenda com a renda das turnês. Não deixei de pagar as contas como muitas pessoas estão fazendo, então, no momento, estou bem. Vou esperar até que seja seguro para todos para voltar à estrada. G1 – Então sua renda principal continua sendo a música. Eu pensei que as vendas da produção da fazenda poderiam substituir de alguma forma ainda mais agora… Jason Mraz – Não, na verdade, eu perco dinheiro com a agricultura hoje. O objetivo com a fazenda é que, talvez, daqui a 10 ou 20 anos, começaremos a ganhar alguma coisa, mas, no momento, é preciso muito investimento, muito paciência e muita experimentação. Dependo da música para pagar pelo que faço aqui. G1 – Conta um pouco sobre a vida na fazenda. Quando você decidiu mudar e como tem sido essa experiência de ficar mais próximo da natureza? Jason Mraz – Eu mudei para cá em 2004, porque eu queria estar perto da natureza, longe das luzes da cidade, plantar minha própria comida e fruta, trabalhar com a terra e ser um artista bom, um cidadão bom, todas aquelas coisas. Tem sido bem gratificante e me dá espaço para ser músico e ainda cultivo comida e, agora, café. Nós cultivamos todos os tipos de árvores frutíferas, beneficiamos a captação de carbono, a agricultura regenerativa devido às nossas práticas de agricultura orgânica. É uma ótima maneira de viver, tenho uma boa qualidade de vida e estou muito ocupado. Jason Mraz no estúdio da fazenda em que mora na Califórnia Reprodução/Instagram/JasonMraz G1 – Mas você sente falta de viver em turnês, especialmente as mundiais como a do disco 'We sing, we dance, we steal things'? Jason Mraz – Sim, eu sinto falta disso, porque era uma vida privilegiada. Você pode conhecer o mundo e com pessoas de diferentes tipos de culturas, falar línguas diferentes. Todas as noites você está cantando e tocando músicas que as pessoas cantam junto, batem palma, se divertem. É uma vida bonita e eu sinto falta disso. Espero que um dia a gente possa retornar a tudo aquilo. G1 – O que mais você tem feito nessa quarentena? Jason Mraz – Na maior parte do tempo, estou cuidando das coisas da fazenda, mas eu também estou fazendo várias ligações e entrando virtualmente em programas para falar sobre o disco. Também comecei a fazer um programa de TV aqui nos Estados Unidos, o que é interessante porque eu nunca pensei que estaria fazendo isso, mas perder minha renda de shows fez isso parecer uma boa oportunidade de tentar algo novo. Jason Mraz faz show em São Paulo em 2017