Receitas caíram 41,6% na comparação com o mesmo mês de 2019, enquanto que os gastos saltaram 68%; déficit do mês superou todo o rombo do ano passado, que somou R$ 95 bilhões. Em meio à crise causada pela pandemia do novo coronavírus, as contas do governo federal registraram em maio um déficit recorde de R$ 126,6 bilhões. O valor inclui os resultados do Tesouro Nacional, da Previdência Social e do Banco Central (BC). Maio do ano passado registrou rombo quase dez vezes menor, de R$ 14,7 bilhões.
O resultado é explicado pela queda significativa na arrecadação, combinada com o forte aumento nas despesas devido ao combate à Covid-19. As informações foram divulgadas nesta segunda-feira (29) pela Secretaria do Tesouro Nacional.
Foi o pior resultado mensal da série histórica da instituição, iniciada em 1997. Até então, o maior rombo nas contas públicas tinha sido o registrado em dezembro de 2015, de R$ 72,7 bilhões (em valores corrigidos pela inflação).
O conceito de déficit primário quer dizer que as despesas superaram as receitas, mas não inclui os gastos com juros da dívida pública.
Para se ter ideia da dimensão do resultado, o rombo fiscal de maio foi superior ao déficit registrado em todo o ano de 2019: R$ 95 bilhões.
Segundo a área econômica, o número do mês passado foi influenciado pela queda real (acima da inflação) de 41,6% na receita líquida do governo federal e pelo crescimento real de 68% na despesa total.
O recuo na arrecadação deve-se, principalmente, ao adiamento no pagamento de impostos por parte de pessoas físicas e empresas.
Já a alta nas despesas é explicada pelas medidas de combate ao novo coronavírus, bem como pela antecipação do pagamento do 13º de aposentados e pensionistas.
De acordo com o Tesouro Nacional, a pandemia aumentou os gastos públicos em R$ 53,4 bilhões apenas no mês passado, com destaque para o auxílio emergencial (que somou R$ 41,1 bilhões) e para o Benefício Especial de Manutenção do Emprego e Renda (que custou R$ 6,5 bilhões).
No acumulado de janeiro a maio deste ano, ainda segundo informações do Ministério da Economia, o rombo nas contas do governo somou R$ 222,5 bilhões, em comparação ao rombo de R$ 17,5 bilhões no mesmo período do ano passado.
Rombo fiscal acima de R$ 700 bi
A Secretaria do Tesouro Nacional estima que o rombo nas contas do setor público consolidado (governo, estados, municípios e empresas estatais) deverá somar R$ 708,7 bilhões em 2020, ou 9,9% do Produto Interno Bruto (PIB).
Se confirmado, esse será o maior valor da série histórica do BC, iniciada em 2001.
O déficit primário acontece quando as despesas do governo superam as receitas com impostos e contribuições. Quando acontece o contrário, há superávit. Esse valor não considera os gastos do governo com o pagamento dos juros da dívida pública.
Em todo ano passado, as contas do setor público consolidado registraram um déficit primário de R$ 61,872 bilhões (0,85% do PIB).
Para este ano, somente o governo tinha de atingir uma meta de déficit primário de até R$ 124,1 bilhões. Entretanto, com o decreto de calamidade pública por conta da pandemia, proposto pelo governo e aprovado pelo Congresso Nacional, não será mais necessário atingir esse valor.
De acordo com o governo, esse rombo nas contas públicas acontecerá por conta das despesas autorizadas para combater a crise do coronavírus, seja as anunciadas na área de saúde, ou para evitar o aumento do desemprego e compensar a perda de arrecadação.
O Tesouro Nacional fez, ainda, um "alerta" de que essa previsão de R$ 708,7 bilhões de rombo fiscal para este ano pode ficar maior ainda.
"A renovação de qualquer um dos programas já aprovados poderá aumentar o valor desse déficit primário do setor público para além de R$ 708,7 bilhões, ou seja, para um valor acima de 10% do PIB, o que levaria a um déficit nominal ou Necessidade de Financiamento do Setor Público (NFSP) para um valor acima de 15% do PIB, com forte impacto no crescimento das dívidas líquida e bruta", informou.
Auxílio emergencial
Durante coletiva de imprensa nesta segunda, o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, afirmou que a prorrogação do Auxílio Emergencial vai significar uma despesa extra de R$ 100 bilhões, o que deve levar o déficit primário para cerca R$ 850 bilhões (11,5% do PIB).
Segundo o secretário, o governo ainda está discutindo a forma de pagamento dessa prorrogação. Os dois cenários estudados preveem um valor de R$ 1.200, que pode ser pago em duas parcelas de R$ 600 ou em parcelas retroativas de R$ 500, R$ 400 e R$ 300, como proposta na semana passada pelo presidente Jair Bolsonaro.
Parte do recurso para pagar a prorrogação do benefício, segundo o secretário do Tesouro Nacional, deve vir de verbas destinadas ao Programa Bolsa Família e que não estão sendo usadas. Isso porque grande parte dos beneficiários do programa migrou para o auxílio emergencial, que paga um valor maior ao beneficiário.
O Ministério da Cidadania, responsável pelo pagamento do Bolsa Família, tem o maior empoçamento de recursos, com R$ 5,6 bilhões em despesas previstas e não executadas.
De janeiro a maio, o orçamento do governo registra um empoçamento recorde de R$ 28,3 bilhões.
Auxílio permanente
Mansueto Almeida afirmou que o governo não tem liberdade para criar um programa permanente, mesmo que seja um programa social, sem indicar a fonte do recurso que será usado no programa e sem respeitar a regra do teto de gastos.
O secretário lembrou que o teto de gastos ainda está valendo e que o governo ganhou autorização para direcionar recursos extraordinários para o combate à pandemia em programas que começam e terminam em 2020.
Dívida perto de 100% do PIB
De acordo com o Tesouro Nacional, o forte crescimento do rombo das contas públicas neste ano deve pressionar a dívida bruta. O valor deve passar de 75,8% do PIB, no final de 2019, para mais de 95% do PIB diante das medidas já anunciadas para o combate ao coronavírus, um crescimento de quase 20 pontos percentuais.
O patamar da dívida bruta brasileira já estava, no fim do ano passado, bem acima da média dos países emergentes – de pouco mais de 50% do PIB.
"É fundamental o retorno do equilíbrio fiscal no médio prazo para colocar a dívida pública em uma trajetória de queda, objetivando, dentre outros benefícios, recuperar a capacidade de investimento do Estado brasileiro e alcançar maior liberdade fiscal para aumentar a oferta de serviços públicos essenciais de forma sustentável", avaliou o Tesouro Nacional.