Seguidores de cantores da MPB, como Caetano Veloso e Maria Bethânia, esperam apresentações dos ídolos nesse período de isolamento social. ♪ ANÁLISE – O show não pode parar, sentencia a máxima da indústria da música. E não parou nem nessa fase de isolamento social em que o mundo vive confinado em casa, à espera da cura para o mal. A música tem sido um alento, um sopro de ânimo na humanidade ansiosa pelo fim da quarentena. A música continua chegando ao público através dos discos que continuam a ser arremessados semanalmente nas plataformas de áudio – em ritmo quase igual ao de antes da pandemia, diga-se – e vem entrando pelas casas sobretudo através de lives que diariamente mobilizam milhões de seguidores de cantores mundo afora, com especial fervor no Brasil. Embora todo o universo pop tenha entrado em compasso de espera pelo fim da quarentena para que os shows remarcados possam ser confirmados, as lives mantiveram reforçados os elos do público com as vozes que sempre o acalentaram. A plateia fica invisível no raio de visão do cantor. Mas a plateia está lá, com os olhos grudados na tela. As lives proliferaram com tal força no Brasil que deverão até sobreviver, como nicho do mercado, após o fim da pandemia. Até porque podem ser lucrativas em todos os sentidos. No Brasil, os artistas sertanejos apontaram o caminho ao rentabilizar as lives com patrocínios de empresas e marcas que normalmente bancam esses cantores seguidos por milhões. Artistas de médio porte também estão conseguindo algum alívio financeiro quando contratados por instituições culturais para apresentações programadas dentro de festivais e eventos virtuais dessas empresas voltadas para a cultura. Contudo, uma questão já se impõe e reverbera nas redes sociais. Ser ou não ser um artista que faz live para entreter o público que angariou ao longo da carreira – eis essa questão que vem gerando cobranças, em especial para os ícones da MPB. É natural que seguidores de Ana Carolina, Caetano Veloso, Gal Costa, Maria Bethânia, Marisa Monte e Milton Nascimento, entre outros nomes, estejam ansiosos por uma live desses cantores. Ao mesmo, esses artistas têm todo o direito de optar por permanecerem quietos em casa. A julgar por vídeos postados pela empresária Paula Lavigne em rede sociais, Caetano Veloso – para citar nome cobrado pelo público – tem sinalizado certa resistência à ideia de fazer live, talvez até por sentir de longe a pressão. E quem há de negar esse direito ao artista? Ou a qualquer outro cantor que prefira ficar calado neste momento? Teresa Cristina faz sucesso com lives temáticas, feitas na madrugada com prosa tão boa quanto a música Reprodução / Vídeo O canto é forma de arte e, como tal, precisa brotar de forma espontânea. Ninguém está errado. Até porque, de certa forma, lives também se tornaram um negócio silenciosamente acordado entre cantores e fãs com lucros para ambos. Os cantores acalentam os fãs com canções e estes mantêm os cantores em evidência, reverberando nas redes sociais as proezas dos intérpretes preferidos. Ganha a mídia e o público o artista que abre uma janela virtual na própria casa para se mostrar presente em momento tão delicado da história da humanidade. E, nesse sentido, as lives também podem ser janelas estratégicas para cantores já menos populares que, de outra forma, estariam isolados do público que já escasseou nas apresentações convencionais. Nesse tabuleiro, cada um se move como bem entende. Cantoras como Mônica Salmaso (criadora da aclamada série de duetos virtuais Ô de casas), Simone (saudada nas redes por conta das lives dominicais em que a Cigarra vem cantando músicas há anos ausentes do repertório) e Teresa Cristina (a musa das madrugadas com lives espontâneas e temáticas, feitas com cerveja e música tão boa quanto a prosa da artista) estão bem na foto. Mas e daí que Gal Costa venha sendo, por ora, somente uma espectadora das lives de colegas como a citada Teresa? O show não pode parar mesmo? Para alguns cantores, o show pode parar por motivos que somente a cada um diz respeito. E que pode até ser pura e simples falta de interesse. Mal nenhum há nisso. A liberdade é a nota mais afinada quando se toca em questões musicais.