Em entrevista ao G1, cantor fala de nova fase após polêmicas e rompimento de contrato com gravadora: 'Porradas lá atrás foram mais fortes'. Podcast debate cultura do cancelamento. Nego do Borel alterna alguma falta de noção e muita religiosidade em sua única música lançada neste ano, a primeira após rompimento do contrato com a gravadora Sony, no fim de 2019. "Vida de Bacana" resume bem os últimos meses da carreira dele, hoje pausada por conta do isolamento social. Na letra, o funkeiro carioca de 27 anos se diz perseguido e querendo fugir de tretas, mas depois canta: "Nego do Borel falando, tiro na tua cabeça / Agradeço a Deus por tudo, por sempre me proteger". "A maioria dos jovens quer ter uma vida boa, uma vida de bacana. Quando atinge um outro patamar, cria muitas invejas, sabe?", diz ele ao G1, explicando o clipe que chegou a 8 milhões de views em três meses. "Muitas críticas, vocês sabe como é que é. Porque às vezes na nossa música, no nosso trabalho, a gente não estuda para cantar o funk. A gente dá sorte e Papai do céu abençoa pra fazer sucesso." Nego fala com propriedade quando o assunto é "como é ser criticado". Se existisse um ranking de artistas cancelados no Brasil em 2019, o cantor provavelmente teria ficado no topo. Ele protagonizou vários episódios polêmicos, com destaque para dois: Fez perguntas de matemática em troca de dinheiro para crianças que trabalhavam no sinal, zoando quando elas erravam; Fez um comentário transfóbico dizendo que a webcelebridade transexual Luisa Marilac era "um homem gato". O G1 perguntou o que todo mundo quer saber: você se sentiu cancelado? "Em nenhum momento. Eu estou mais do que maduro para viver isso que eu estou vivendo, para viver o que eu vivi. As porradas lá atrás foram maiores. Hoje tudo o que vem é lucro." Nego do Borel no clipe 'Vida de Bacana' Divulgação "A gente vai errando, aprendendo, errando, aprendendo, errando, acertando, acho que errando… Eu me arrependo, sim, de algumas coisas, mas eu vejo como um aprendizado na minha vida. E vou subindo de nível mental, nível pessoal, nível profissional e a vida é uma escola", conclui. Mas será que ele sentiu que ele sentiu que teve artista que passou a tratá-lo diferente? "Tiveram pessoas que viraram as costas pra mim, sim", admite, sem citar nomes mesmo após o G1 perguntar. "Jamais vou sentir raiva, quero que Papai do Céu abandone essas pessoas. Mas é bom pra gente quem é quem, e quem está com a gente.” Ao dizer quem sempre esteve com ele, Nego do Borel cita a mãe, a equipe, os fãs e a ex-namorada, a influenciadora Duda Reis. “Eu recebi muito carinho deles. São o meu combustível para eu continuar andando, sabe? São como se fosse a minha gasolina", compara. Nego do Borel dá beijo em Duda Reis no Rock in Rio 2019 Marcos Serra Lima/G1 O funkeiro também buscou apoio na religião. Ele vai a cultos da Igreja Batista da Lagoinha, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio. Ao ser perguntado se teve algum medo de perder o que havia conquistado antes do "cancelamento", ele fica um pouco emocionado: "Eu sei quem eu sou, eu conheço o meu coração. Eu tô bem com Deus, sabe? Papai do céu me conhece e eu sou um cara muito religioso." "Quem me deu foi Papai do Céu e só quem pode me tirar é ele. Se ele falar que vai tirar, ele vai tirar. Então, é só ficar seguro nele e fazer as coisas certas. Eu acho que foi um aprendizado pra gente aprender e não errar mais." Mas é possível continuar cantando letras maliciosas e indo aos cultos? "É claro que é possível. Dá pra gente dar uma maneirada, fazer as coisas certas. Mas Deus me usa, transforma as pessoas por meio de mim e do funk. Eu não tenho que largar o funk para ir à igreja e vice-versa." 4 milhões de fãs a mais Nego do Borel Divulgação/Washington Possato De 2018 a 2020, o cantor ganhou 4 milhões de seguidores no Instagram: hoje tem 11,5 milhões. Números como esse mostram que o cancelamento é, sim, relativo. Um desses seguidores é o jogador holandês Memphis Deepay: uma inusitada obsessão futebolística do cantor. Nego do Borel pode até ter perdido parte do público, mas segue com o aval de parceiros cobiçados. O segundo semestre do ano passado teve feats com Wesley Safadão ("Ding Dong"), Matuê ("Princesa") e Ferrugem ("Ela bota pra F…"). Segundo ele, o pagodeiro é um dos poucos que nunca o abandonou: "Ferrugem é um cara que eu vou levar pra sempre comigo. Ele esteve junto comigo no momento mais pesado." Nego do Borel com crianças no Realengo e montagem publicada por ele no Instagram em post sobre a Covid-19 Reprodução/Instagram/NegodoBorel Para trazer mais leveza, ele vem divulgando várias boas ações. Ele já cantou com artistas de rua em Portugal e hospedou em um hotel de luxo uma mulher que estava sozinha no aeroporto após levar um bolo. Também tirou foto e fez doações a garotos de comunidades cariocas. O cantor também aposta em um artista que era vendedor e malabarista em um sinal no Rio. Du Farol MC é o codinome de Roberth Sales. Ao lado de Borel e do produtor Papatinho, lançou seu primeiro clipe ("É Sim ou Não BB") no mês passado. Du Farol MC e Nego do Borel Divulgação Leno Maycon Viana Gomes carrega em seu nome artístico uma referência ao Morro do Borel, comunidade na Zona Norte do Rio onde foi criado. "Hoje, não dá para ver muita diferença do funk pop para o funk de favela, porque está tudo uma parada só. Eu acho que está mais escutado nas casas e desceu com força pro asfalto." A música pop brasileira também vem ganhando força fora do Brasil e Nego sabe disso. Ele tem feito aulas de inglês. "Eu sei que daqui a uns dois anos o funk vai estar muito explodido fora do Brasil. A gente vai ter que se comunicar com os gringos." Nego do Borel fez uma sala de aula em casa. Ele diz que estuda até três horas por dia, de segunda a a sexta. "O segredo está na nossa força de vontade. A gente é tudo que a gente quiser. Se eu quero aprender e estou focado, não tem mistério." Imagem publicada no Instagram de Nego do Borel cita história contada por Renato Aragão Reprodução/Instagram/NegodoBorel