Ao G1, Josh Evans explica como versos raivosos de Eddie Vedder sobre mudanças climáticas e Trump refletem preocupação da banda com as notícias. Ouça trechos do disco ‘Gigaton’. "É estranho ver o que viraram as emoções desse disco nos últimos dias", diz Josh Evans, produtor do sombrio e raivoso "Gigaton", 11º álbum do Pearl Jam. Assim como a banda, Josh é de Seattle, cidade que foi o primeiro foco do coronavírus nos EUA. Isolado em casa, ele falou ao G1 pelo telefone. Eddie Vedder vocifera contra Donald Trump e um mundo em crise climática que "está ficando doido" no disco lançado na sexta-feira (27). Ele mal sabia que a loucura ia ficar ainda maior com a pandemia. Mas a trilha sombria, com alguns sinais de esperança, não deixa de ser adequada aos dias de hoje. Ouça acima o podcast G1 Ouviu sobre o novo disco do Pearl Jam e o legado do grunge. Pearl Jam Divulgação Josh, de 41 anos, estreia como produtor do Pearl Jam. O currículo não é muito estrelado, mas ele circula bem em Seattle e assinou produções do falecido Chris Cornell e da sua banda, o Soundgarden. Ela trabalha há anos com o Pearl Jam, "desde carregar caixas até pintar paredes do estúdio". É o primeiro trabalho da banda com outro produtor após 30 anos com Brendan O'Brien. Josh fala como profissional e fã: "Eu aprendi a tocar guitarra ouvindo discos do Pearl Jam".. Ele se sentia "roubando ideias" dos músicos. "Eu só repetia para eles o que me ensinaram". Leia a entrevista: G1 – Estrear com o Pearl Jam depois de 30 anos com o mesmo produtor te deixou nervoso? Josh Evans – Foi muito estranho. Meu histórico é de engenheiro de áudio. Mas nos últimos 10 anos eu trabalhei com a banda em outras coisas. Fiz desde carregar caixas e pintar paredes de estúdio a ser um roadie e técnico de teclado. Nos últimos cinco anos, trabalhei com discos solo deles. E aí, em janeiro de 2017, começaram a marcar sessões de estúdio. De início eu só ia ajudar a gravar a demo. Uma hora ficou claro que eram as músicas de verdade. Foi engraçado, eles nunca disseram: "você é o produtor". Só fui gravando. Josh Evans, produtor de 'Gigaton', do Pearl Jam Divulgação G1 – Então como foi quando você descobriu que era o produtor do disco? Josh Evans – Foi aterrorizante e gratificante. Fiquei assustado em ter essa responsabilidade. Mas tive sorte de eles terem confiado em mim. Eu nasci em 1978, em Seattle, então era adolescente quando o grunge estava acontecendo. Eu fui a muitos shows do Pearl Jam como fã quando garoto. Parece que estou trapaceando. Aprendi a tocar guitarra ouvindo Pearl Jam. Agora o Mike [McCready] e o Stone [Gossard] me perguntam: "o que seria legal aqui?". Eu só penso no que eles me ensinaram. E eles falam "boa ideia." Nem é ideia minha, eu roubei deles. Só repito para eles 20 anos depois. G1 – Quanto tempo vocês passaram com esse disco? Josh Evans – Dois anos. Na abertura de "Retrograde", por exemplo, eu devo ter passado uns dois dias experimentando coisas diferentes, esticando partes de guitarras e mexendo no Pro-tools. É muito legal ter o luxo de ter esse tempo, horas incontáveis. G1 – Já existia o nome e a ideia de 'Gigaton' desde o começo? Parece tudo amarrado com os vocais, o baixo mais forte, as letras… Josh Evans – Eles me falaram o nome só depois. Não acho que foi intencional no começo. Mas Eddie e todos os membros pensam em tudo que está acontecendo no mundo. Eles não falaram: "vamos fazer um disco sobre mudanças climáticas, ou política". Era só o que estava na cabeça deles hoje em dia. É estranho ver o que viraram as emoções desse disco nos últimos dias. Não dava para prever. Eddie Vedder, do Pearl Jam, no show solo desta quarta-feira (28) no Citibank Hall, em São Paul Celso Tavares/G1 G1 – E vocês conversavam sobre essas coisas no estúdio? Josh Evans – Sim. Mas do mesmo jeito que todo mundo: você acorda, toma seu café, lê as notícias e fala: "Viu o que o Trump fez hoje? O que eles estão falando? Não acredito no que está acontecendo". O bom de uma banda como o Pearl Jam é que eles conseguem colocar essas emoções nas músicas. No estúdio nunca foi uma coisa direta tipo "estou bravo com o Trump, vamos escrever uma música sobre ele". Estávamos vivendo nesse mundo e tentando entendê-lo juntos. Mas como todo mundo, havia muita conversa no estúdio, todo dia, sobre como esse mundo ficou doido. Pearl Jam encerra apresentações do segundo dia do Lollapalooza 2018 sob o comando do vocalista Eddie Vedder Marcelo Brandt/G1 G1 – Sendo de Seattle, você concorda que eles estão fazendo um grunge maduro? Josh Evans – Para a gente em Seattle o termo grunge nunca significou muito, é uma coisa de pessoas de fora. Mas acho que tentamos manter a autenticidade, crueza e a honestidade desses artistas grunge. E sim, acho que tem uma uma maturidade. Eles foram corajosos, tentaram coisas diferentes. É o disco que esses cinco caras poderiam fazer hoje. É um registro dessa época de quem eles são, de um jeito que ninguém mais podia ter feito. G1 – A música 'Comes then goes' parece feita para um amigo de Eddie que morreu, e especulou-se que era Chris Cornell. Ele falou sobre isso? Josh Evans – Nunca falamos explicitamente sobre nenhuma letra. Mas a morte do Chris teve um enorme impacto sobre a banda – e em mim também. Eddie e Matt [Cameron] foram muito próximos dele. Acho que a morte dele influenciou elementos de todas as músicas. Como não poderia? Mas não acho que o Eddie é um compositor direto. A genialidade dele é pegar o que está acontecendo no mundo, na casa dele, no coração dele, nos vizinhos, incorporar nas letras e fazer isso se conectar com todos. Não sei onde está a influência do Chris, mas sei que está em todo lugar.