Em entrevista ao G1, ator comenta última temporada do anti-herói e defende futuro da série sobre médicos: 'certeza de ser a hora errada'. Júlio de Andrade têm levado uma vida agitada nos últimos dois anos. Além de estrelar duas séries de sucesso ao mesmo tempo, o ator gaúcho de 43 anos também participou de uma novela, "Amor de mãe", e de dois filmes. Em 2020, ele se despede do anti-herói de "1 contra todos", aguarda o futuro de "Sob pressão" e se prepara para um novo trabalho, um seriado sobre o sociólogo Betinho no Globoplay. "Essa perspectiva do Betinho tem me deixado muito empolgado, porque acho um personagem muito importante da nossa história que muita gente não conhece, principalmente a nova geração", afirma Andrade em entrevista ao G1. O ator atualmente está em sua casa, em São Paulo, na qual enfrenta o isolamento provocado pela pandemia do novo coronavírus. Em conversa pelo telefone, ele falou também sobre o último ano de "1 contra todos", que estreou nesta sexta-feira (27), as próximas temporadas de "Sob pressão", cujo fim foi cancelado após apelo do público, por que não gosta de fazer novelas e como escolhe trabalhos. "A novela tem uma coisa. É perigoso falar isso, mas ela se dá pela audiência. E para mim, como ator, eu gosto de construir um personagem do começo ao fim. Então essa coisa de um personagem que pode ir para um lado, pode ir para o outro, não é muito pra mim." Leia a entrevista inteira abaixo: Júlio Andrade em cena de 'Sob pressão' Divulgação G1 – O que anda fazendo nessa época de isolamento? Está em casa? Júlio Andrade – Me sinto muito privilegiado de poder estar em casa, e de poder dar esse tempo até as coisas melhorarem. Estou naquele ócio criativo, aquela coisa de ficar pensando no que fazer nessa situação. O que você como pessoa pública pode fazer para contribuir e expor sua opinião quanto a isso. E uma situação de impotência por não ter vivido nada parecido. Ainda mais na situação política do nosso país, que na minha opinião vai contra os princípios básicos de humanidade, de falta de preocupação real com o que realmente importa, o planeta, as pessoas, o cotidiano das pessoas, o emprego das pessoas. Cansado dessa briga política nesse momento em que o mundo precisa muito cair na real e ver que o que vai salvar é a ação. É que eu estou muito engajado também nessa questão do Betinho, que era um cara que agia sem nenhum vínculo político, sem nenhuma empresa. Era uma questão do povo, né. O povo se dispunha a pegar um quilo de alimento para levar em um lugar para ajudar. E você está nessa situação que não tem nem máscara ou álcool doados para poder ajudar o povo. João Fernandes e Júlio Andrade em cena de '1 contra todos' Divulgação/Fox G1 – Mas vamos falar de "1 contra todos". A última temporada estreou sexta. Como você avalia a evolução do Cadu ao longo dessas quatro temporadas, saindo de um defensor injustiçado até se tornar o chefe de um cartel? Júlio Andrade – Eu acho que desde o princípio do projeto, a gente tinha como principal fio condutor a ética e o caráter de um personagem que não se corrompia, por não ser culpado de nada. A gente conseguiu nas duas, três primeiras temporadas, mas acho que todo mundo ao redor dele se contaminou com o poder de um personagem, como ele foi ganhando poder e como isso influencia na vida dele. Mas nunca perdendo aquele Cadu. A gente tinha todo um cuidado para não deixar ele se corromper por completo, porque ele tem toda essa questão da família, né. Essa temporada ele começa até tentando se descontaminar dessa história do tráfico, que ele construiu junto com o pepe, e tentar voltar às origens da família, tentar reconstruir uma nova família. Mas aí é o Cadu, né. Se ele se desse bem não teria série. Então logo no começo não daria certo. E a série é essa tensão, né. Essa tensão que eu fico filmando e que as pessoas sentem assistindo. É a proposta também de uma série de ação, e eu quis de brincar um pouco disso, de ser um anti-herói. Marlon Moreno e Júlio Andrade em cena de '1 contra todos' Divulgação E deu super certo, porque eu acho que todo esse reconhecimento e esses prêmios se dão também a uma equipe muito talentosa, um diretor extremamente firme, o Breno (Silveira), que sabe o que quer. É um maestro. Um cara que me ensina muito, me ensinou muito sobre cinema, sobre fotografia. É um grande professor de cinema. Deu uma liga muito massa assim também, em relação aos personagens, que são personagens bem construídos, todos, principalmente os da primeira temporada. Alguns até seguem com a gente nas outras, muito ricos. E atores muito talentosos também. Porque quando a gente está trabalhando a galera chega muito nessa energia de jogo e de troca. É todo mundo junto. Todo mundo batendo bola junto. Júlio Andrade, Erasmo Carlos, Seu Jorge e Lee Taylor em cena de 'Paraíso Perdido' Divulgação G1 – A série é com certeza muito diferente de todas as coisas que você tem feito ultimamente, e são muitas. Isso te ajuda a se manter interessado na atuação ou é um desafio a mais? Júlio Andrade – Isso foi até uma escolha minha. Meu maior medo é ficar estigmatizado em um personagem só, sabe. Isso é algo que eu procuro muito a cada personagem. Procuro sempre o desafio. Tem a ver com isso também. Eu preciso ser desafiado. Tem personagem que cai na minha mão e eu aceito de bate-pronto. O Betinho foi assim. O cara ligou e eu falei: "eu quero e é meu". Tem outros que eu penso mais. "Será que é isso que eu quero?" Eu lembro que no meio de "Sob pressão" e "1 contra todos", tinha ali um tempinho vago, fui convidado para fazer o filme da Monique Gardenberg ("Paraíso perdido"). E eu aceitei, porque estava precisando de uma coisa leve. De uma história de amor, de uma família, que tinha uma boate. Eu estava precisando contar aquela história naquele momento. Vou meio nessa pilha assim, entendendo o que eu quero fazer, o que eu quero contar. Porque é uma imersão muito profunda, sabe. Eu não estou de bobeira. Quando eu entro em um projeto, não é pela grana, não é pela fama, estou preocupado que as pessoas embarquem na história, e pra isso acontecer eu preciso estar 100% comprometido. Leandro Hassum e Júlio Andrade em cena de 'Malasartes e o duelo com a Morte' Divulgação G1 – Por que decidiram encerrar a série agora? É importante saber a hora de terminar? Júlio Andrade – Acho que foi um combinado meio que entre a gente. Aconteceu também naturalmente. Acho que tanto da minha parte quanto do Breno e de outras pessoas da equipe. Claro que a gente deixa de fazer um trabalho com um pesar assim gigante, porque a gente também apostou em um veículo que a gente não está acostumado. A gente não está familiarizado. Essa questão de ficar quatro anos fazendo um personagem é a primeira que acontece comigo, assim como foi com o "Sob pressão". Foi uma escolha minha. Eu quis embarcar. Assim como foi com as novelas. Eu fui lá fiz duas novelas, para entender que eu não gosto de fazer aquilo. Acho legal, dou o maior valor. Aplaudo muito quem consegue fazer bem, porque é um ambiente muito difícil, salvo algumas exceções. Júlio Andrade, Adriana Esteves e Chay Suede em cena de 'Amor de mãe' Reprodução/Globo Mas a gente apostou em uma série, sem saber onde ia dar. E agora acabar essa série, de sucesso, que nos levou ao Emmy, que levou muita gente para a frente da televisão, deixar esse trabalho, eu nem sei. Porque é uma coisa que eu ainda estou vivendo agora. Porque com o "Sob pressão" a gente estava pronto pra acabar e lá pelo menos a gente tinha a certeza de era a hora errada, entendeu? Tanto que eu acho que houve uma resposta do público de imediato. Eu acho que é um tema que ainda tem muito a ser falado. Não que eu não ache que o "1 contra todos" não pudesse dar mais temporadas. É um personagem cativante, uma situação extrema, que prende a atenção das pessoas. Mas a minha opinião é que o Cadu, eu não sei, eu não tenho na minha cabeça para onde ele iria mais. Até brinquei outro dia.Ele iria para a lua, sabe? Vender drogas na lua. Mas também, vai saber? A vida é tão maluca. Vai que daqui uns anos a galera resolve voltar e eu estou lá velho e me chamam. Personagem de Julio Andrade na série 'Sob pressão' Reprodução/TV Globo G1 – Mas explica melhor. Por que você não gosta de fazer novelas? O tempo da novela é um pouco longo demais. E a novela tem uma coisa — é meio perigoso falar isso — que é que ela se dá pela audiência. E, para mim como ator, eu gosto de construir um personagem, do começo ao fim. Então essa coisa de um personagem que pode ir para um lado, pode ir para o outro, não é muito para mim. E é muito rápido, sabe. Um ritmo muito frenético para mim. É uma coisa mesmo de construção de personagem. Eu falo isso mas vai saber. Um dia pinta um personagem incrível em uma novela e, vai saber, eu posso voltar atrás e fazer uma. Quem me chama pra fazer são os personagens. O ator Julio Andrade, que dá vida a Gonzaguinha no filme de Breno Silveira: semelhança com o cantor asssutou até a família João Linhares/Divulgação G1 – Do que você vai sentir mais falta da produção? Júlio Andrade – A primeira coisa que me vem à cabeça é de trabalhar com meu parceiro Breno Silveira e com toda a galera que a gente juntou para fazer esse projeto. Ao mesmo tempo, eu como um ator nômade, prefiro embarcar em uma outra viagem, sabe? Acho que vou sentir uma saudade, mas é uma saudade boa, de um tempo que teve o seu fim. E espero que essa temporada seja muito curtida, porque ela foi feita com muito carinho e muito cuidado. E muito frenética também, porque a gente fez em muito pouco tempo. G1 – Com o sucesso de "1 contra todos" e "Sob pressão", como tem equilibrado as propostas para novos projetos e os compromissos que já tem? Júlio Andrade – As coisas que me oferecem na maioria das vezes são coisas muito incríveis. De pensar: "caramba, estou deixando de fazer isso". Ao mesmo tempo, eu me propus a essa aventura. Eu estou no lugar em que eu queria estar. Essa perspectiva do Betinho tem me deixado muito empolgado, porque acho um personagem muito importante da nossa história que muita gente não conhece, principalmente a nova geração. Cada trabalho que eu escolho, eu penso muito antes de escolher. Quando pintam trabalhos incríveis, penso que eu escolhi fazer isso, então não sofro muito com isso. Esse ano por exemplo é um ano diferente, que eu me proponho de tentar fazer um pouco mais com essa popularidade que eu tenho, com esse alcance que eu tenho, de fazer mesmo ações, como o Betinho fazia. O Betinho tinha essa ação de cidadania, pessoas ajudando pessoas, e eu quero fazer isso também , até pra aproveitar a notoriedade que eu tenho. Então é isso, tenho a perspectiva de mais duas temporadas do "Sob pressão", e essa série do Betinho, que era pra acontecer antes, mas agora com tudo isso eu não sei.