Mais que um modo de viajar, trata-se de uma filosofia, onde o importante é explorar um destino e sua cultura com mais tempo, em imersão. Trens são o modo de transporte escolhido por pessoas que praticam o 'slow travel' Arnd Wiegmann/Reuters Em tempos de alertas para a questão ambiental e com a musa Greta Thunberg dando o exemplo – ela não anda de avião e vai cruzar o Atlântico num veleiro – cresce a tendência para o chamado “slow travel” ou “slow tourism”, o ato de viajar lentamente. Tudo devagar, com calma e conteúdo. O “slow travel” é um derivado do movimento “slow food”, surgido nos anos 1980, a partir de protestos contra a abertura de um McDonald’s em Roma. O “slow food” privilegia a comida regional, os produtos locais, refeições comunitárias e a preparação tradicional. Chega de excursões de dez dias visitando 15 cidades na Europa ou Ásia, na correria. O “slow travel”, mais que um modo de viajar, é uma filosofia. O importante é explorar um destino e sua cultura com mais tempo, em imersão. Arne Gudde é o fundador e diretor da empresa Slow Travel Experience, em Berlim, criada em 2010. Em entrevista à RFI Brasil, ele falou a respeito da nova tendência: "Eu ofereço a experiência de um destino em um ritmo lento. Eu percebi cada vez mais que, viajando, era melhor começar a viagem saindo de casa e não pegar um avião para se chegar ao destino. Isso ajuda a criar mais consciência sobre o modo de viajar, de apreciar o trajeto. A consciência pelo meio ambiente é o aspecto mais importante, mas acho importante que para se preservar a natureza, é preciso apreciá-la." Saindo do convencional A Slow Travel Experience propõe viagens bem diferentes das que as empresas de turismo convencionais oferecem. Viagens de trem pela Sibéria e África, trajetos em cargueiros no mundo todo e percursos em veleiros, como explica Arne Gudde: “Normalmente, numa viagem convencional, estamos correndo do ponto A ao B sem prestar atenção, sem apreciar o percurso. Acredito que viajando cada vez mais lentamente, apreciando os arredores, vamos estar mais motivados, automaticamente, para fazer algo, proteger, entender que não precisamos correr tanto.” Embalada pelo “slow food”, a Itália também avança no “slow travel”. Mas a França também já viu o potencial e quer correr atrás. Um relatório recente do governo mostra que o país, apesar de ter recebido um número recorde de visitantes em 2018 – 89,4 milhões – os turistas passam pouco tempo em solo francês e gastam menos que em outros lugares. As iniciativas já estão sendo tomadas em algumas regiões da França. José Louis Pereira, diretor do comitê departamental de turismo de Gers, no sudoeste, fala sobre o movimento no país: “Podemos dizer que se trata de uma tendência importante, mas ainda não explorada. Na França há um momento para usar essa tendência no intuito de reforçar a atratividade turística do país, das regiões envolvidas, como a nossa. O ‘slow tourism’ propõe uma mentalidade de ecorresponsabilidade, nós nos preocupamos com a questão do desenvolvimento sustentável, nos interessamos pela agricultura engajada, que segue um caminho ponderado, orgânico, pelo desenvolvimento local, ligado à cultura e ao patrimônio, aos deslocamentos sem pressa. Ou seja, tentamos reduzir nosso traço ecológico.” O advogado Rafael Lander, 37 anos, resolveu fazer uma experiência diferente em 2010, no Brasil mesmo, pela empresa alemã Slow Travel Experience. A bordo de um cargueiro, ele desceu de Manaus até Vitória: “Eu quis fazer algo mais solitário mesmo, fora do circuito comercial. Eu tinha curiosidade em saber como funciona um navio cargueiro, que é praticamente uma cidade flutuante, como é a vida a bordo, como funcionam os portos, e como é que os bens que a gente consome chegam a nós. O navio saiu do porto de Chibatão, em Manaus, desceu por um dia até chegar à foz, no Amapá; e dali levou mais dois dias descendo até chegar a Vitória”.