Para um coletivo de mulheres de Campo Grande, Lídia Baís é ícone artístico, transgressor e de poder feminino em Mato Grosso Sul. O grupo que se inspira na resistência de Lídia, quer fortalecer as mulheres e, com essa meta, pesquisam, escrevem livros, interpretam peças e se expressam em telas. Neste domingo, a 2ª edição do bazar das “Descendentes de Lídia”, ofereceu oficina e finalizou com roda de conversa sobre a obra, vida e representatividade da artista.
Do nascimento ao fim da vida, o coletivo frisa que a luta de Lídia foi divisor de águas para a representação da mulher na sociedade de Mato Grosso do Sul. A artista e idealizadora do projeto Kim Weis, conta que a ideia do coletivo partiu da necessidade de encontrar um tema para o trabalho de conclusão de curso de Artes da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul).
Kim ressalta que o contato com obras da Lídia iniciaram na infância e, por esse motivo, sempre achou que todos conheciam o trabalho da artista. Frustrada em saber que a história se limitava ao Estado, a acadêmica decidiu falar sobre o tema aos quatro cantos do país.
“Para mim ela sempre foi um referencial como mulher e como espiritualidade, diante da ligação dela com a natureza. Depois que conheci Frida Kahlo vi que a Lídia estava ali, na mesma posição. E quando nasceu a necessidade de fazer meu projeto de TCC eu queria falar da mulher, da arte, da Lídia. A decisão de montar o coletivo surgiu depois de uma exposição que reuni mulheres artistas, com trocas e roda de conversa. No início foi formado por sete mulheres, hoje somos dez”, conta.
Kim frisa que desde o inicio o coletivo vem da união. “Eu não poderia e nem queria fazer sozinha. Na minha vida hoje tudo que eu estou vivendo é por ter a base dessas mulheres, da minha família, amigas e mulheres que vão me ajudando”, pontua.
A historiadora Fernanda Reis, que também trabalha com instalação artística, explica que o coletivo se identifica como um grupo de mulheres feministas e de esquerda, partindo da arte. Reis também escreveu o livro Lídia Baís – Arte, Vida e Metamorfose.
“Para nós, Lídia Baís representa esse feminino resistente, transgressor ela era uma mulher que viveu numa época marcada pelo patriarcado, principalmente, Mato Grosso do Sul que trazia herança do patriarcado do século IXX por ser o pai dela um homem rico e influente na cidade e no Estado. Toda a vida de Lídia é marcada pela resistência feminina, ela foi a contrapelo de tudo aquilo que se esperava de uma mulher naquela época, especialmente, por ser uma mulher rica. Ela negou o casamento, a maternidade e quis se colocar na história como uma mulher artista”, explica.
Para as Descendentes de Lídia, a historia da artista é totalmente marcada por esse movimento de resistir ao que era imposto. “Então para nós, ela é muito mais que uma mulher artista, mas uma mulher que resistiu e que dialoga muito com o que nós mulheres somos ainda”, pontua.
Para a integrante do coletivo Ana Carolina Sandim, Lídia rompeu barreiras. “Ela rompeu barreiras em Mato Grosso do Sul em relação à arte, a querer fazer museu, a quer que o Estado produzisse arte. Então, ela é muito importante para nós mulheres que queremos produzir arte em Mato Grosso do Sul”, pontuou.
A artista Márcia Albuquerque que trabalha com pinturas em tela e performance em pintura destaca um paralelo entre o cenário político atual e a luta de Lídia.
“Nós estamos num momento do cenário nacional em que o machismo e toda uma política ganha força contra as mulheres e minorias. Isso vai ao encontro da luta de Lídia que foi essa mulher transgressora e contra o patriarcado e todas essas regras impostas. Então, neste momento, nosso grupo traz a imagem da Lídia e trabalha toda essas questões que a envolvem o feminino, como uma forma de nos fortalecer enquanto grupo e a fortalecer outras mulheres”, disse.
O bazar com vendas de roupas, comida e acessórios durante a intervenção faz parte do fortalecimento das mulheres e da produção feminina. A terceira edição do bazar está previsto para junho no Genuíno.
O coletivo descendentes de Lídia venceu edital da Fundação de Cultura e a próxima exposição do Marco ganhará telas instalações, fotografias, performances e peças inspiradas em Lídia.
Além do coletivo, Tatiana De Conto participa do movimento da Lídia como inspiração, com um espetáculo que está na 32ª apresentação. “Ele conta a vida e obra de Lídia desde o nascimento ao último suspiro. Bastante didático, ele foi preparado para as escolas, pois a preocupação era fazer com que todos entendessem a trajetória, a obra e parte musical dela”, explica.
Durante o evento Kim ministrou a oficina Imersão, que é uma reconexão da mulher com a criança interior. O objetivo é alcançar um processo criativo.
“Lá na infância você criava, tinha imaginação, conversava com animais. A “Imersão” serve para poder ter um olhar carinhoso e infantil com o mundo. É uma perspectiva decolonial, que é essa questões de retornarmos a nossas raízes sem a oposição da colonização. Tem toda uma questão espiritual, da ligação com natureza, a quebra de barreiras com o toque e com o próximo”, finalizou.
O evento finalizou com uma grande roda de conversa entre o coletivo, pesquisadores, acadêmicos e demais envolvolvidos e interessados na história de vida da artista.
Fonte: Campo Grande News.