No fone, no celular, no carro ou em casa. Nas grandes metrópoles ou no meio rural. Com uma imensa capilaridade, o rádio é um meio de comunicação de baixo custo que faz companhia e leva notícias, informação e cultura para os mais diversos públicos em todo o planeta há cerca de 100 anos. No Brasil, desde os anos 1930, a música brasileira, as obras literárias, o teatro e os concertos, antes restritos aos que sabiam ler ou aos que tinham condições de ir a espetáculos, passaram a ser difundidos por todo o território por meio de programas e radionovelas, que permitiram a difusão da cultura nacional em proporções até então impensáveis, especialmente em uma época que a taxa de analfabetismo ultrapassava a metade da população. Em 1940, 56% dos brasileiros eram analfabetos, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Foi justamente para debater as possibilidades de uso deste veículo com imenso potencial multiplicador e sem fronteiras que a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) criou a data de 13 de fevereiro como o Dia Mundial do Rádio. A data, instituída em 2013, foi escolhida por ser o dia de criação da Rádio ONU, lançada logo após o fim da 2ª Guerra Mundial, em 1946. Desde que a efeméride foi estabelecida, a cada ano, um assunto é selecionado. Em 2019, o tema é diálogo, tolerância e paz. “O rádio tem essa capacidade de ser compreendido pelos públicos mais diversos, fomentar o diálogo”, explica o coordenador do Setor de Comunicação e Informação da Unesco no Brasil, Adauto Soares.
No Brasil, o Dia do Rádio é comemorado em 25 de setembro em homenagem a Edgard Roquette-Pinto, considerado o “pai da radiodifusão” no Brasil. Ele fundou, junto com Henrique Morize, a primeira emissora do Brasil: a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, em 1923. Atualmente, ela está no ar como Rádio MEC AM 800 e MEC FM 99,3. Foi a pioneira como emissora educativa no País e incorporada pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC), instituição de comunicação pública.
“Me encanta a frase do Roquette-Pinto, que esperava que o rádio fosse o livro daqueles que não sabiam ler”, lembra o professor e diretor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB), Fernando Oliveira Paulino. Ele destaca o papel do rádio no Brasil. “O caso brasileiro é bem interessante para a gente perceber como intelectuais e pessoas que tinham uma preocupação com a modernização do país, a democratização da informação e da cultura, poderiam fazer do rádio e também do cinema, no início do século 20, canais de compartilhamento de informação, de cultura e, consequentemente, de cidadania”, afirma.
A primeira transmissão oficial de rádio no Brasil foi em 7 de setembro de 1922: para festejar o primeiro centenário da Independência do País, algumas dezenas de pessoas conseguiram ouvir no Rio de Janeiro a primeira audição. Receptores vindos dos Estados Unidos foram instalados em vários pontos da cidade. E os ouvintes puderam conferir um programa composto de músicas e do discurso do então presidente da República Epitácio Pessoa.
O rádio permitiu que os brasileiros tivessem acesso ao que se produzia no País e, ao mesmo tempo, tornou possível mostrar ao mundo o que se produzia internamente em termos musicais e literários. Grupos musicais, mas, especialmente, as cantoras, tiveram, entre os anos 1930 e 1960, uma popularidade incrível. Ângela Maria, Linda e Dircinha Batista, Marlene, Dalva de Oliveira, Emilinha Borba e até Carmen Miranda, eram chamadas “as rainhas do rádio”.
Em paralelo, as radionovelas, apesar de serem um fenômeno internacional, começaram a ganhar mais força no Brasil, a partir dos anos 1940, e lançam uma série de cantores e atores que são referências na dramaturgia nacional, como Henriqueta Brieba, Paulo Gracindo e Mário Lago.
As radionovelas também influenciaram as telenovelas brasileiras, reconhecidas internacionalmente por sua excelência, e ainda levaram ao público adaptações de grandes clássicos da literatura brasileira e internacional. “Junto com as radionovelas que tinham adaptações literárias, sugiram experiências interessantes de dramaturgia associada à educação e à cultura, baseadas nas questões do cotidiano da população brasileira”, apontou o professor.
O rádio foi o principal meio de comunicação para os brasileiros até a década de 1950 com a chegada de aparelhos de televisão no País. Mesmo com a pressão e a invasão da produção musical internacional, Paulino destaca que a força da música brasileira fez com que, ao longo do tempo, surgissem algumas experiências públicas e privadas de produção, distribuição e acesso a conteúdos musicais brasileiros. Na avaliação dele, a garantia de espaço para conteúdo nacional deveria ser, inclusive, um esforço em forma de política pública.
Apesar do surgimento de novos meios de comunicação, o rádio continua sendo bastante utilizado, em especial no interior do país. “O rádio, talvez, tenha sido a tecnologia que mais tenha conseguido se adaptar ao ambiente virtual de maneira a usar a internet como uma plataforma para distribuição dos seus conteúdos”, completa Paulino.
Estúdio F
A história da música brasileira por meio dos seus protagonistas, sejam eles compositores, cantores, instrumentistas ou conjuntos musicais, vem sendo contada desde 2006 por um programa semanal de rádio intitulado “Estúdio F”, produzido pela Fundação Nacional de Artes (Funarte), entidade vinculada ao Ministério da Cidadania. Já foram ao ar mais de 400 edições, transmitidas por meio da EBC para emissoras como a Rádio Nacional do Rio de Janeiro, Rádio Nacional de Brasília, Rádio Nacional da Amazônia e Rádio Cultura Brasil.
“Tem desde conjuntos como os Racionais MCs até música erudita como, por exemplo, Nelson Freire ou o maestro Radamés Gnattali, ícones do choro como Pixinguinha, Jacó do Bandolim, Waldir Azevedo, grandes nomes da chamada MPB como Tom Jobim, Chico Buarque, Caetano Veloso, a turma do samba- canção, com as grandes divas da era de ouro do rádio, a turma dos primórdios da história do samba”, exemplifica o pesquisador e apresentador do programa, Pedro Paulo Malta, que também é coordenador de Difusão e Pesquisa da Funarte.
Para Malta, o rádio tem entra na vida das pessoas como nenhum outro meio. “Ele é um meio absolutamente fundamental para a difusão da nossa cultura, de uma forma muito ampla e, especificamente, no caso da música, porque a música brasileira é um tesouro. O mundo inteiro cultua esta música”, destaca. “As batucadas tão diferentes, as levadas de violão, as particularidades da nossa produção dentro da música de concerto. Tudo isso é um material tratado a peso de ouro no mundo”, complementa.
Malta destaca que o rádio leva uma vantagem em relação a outros veículos de comunicação: o de poder sugerir imagens ao ouvinte. “A gente conta a história de personagens e isso se completa na imaginação de quem está ouvindo, o que cria um ambiente de cumplicidade especialíssimo. Acho que, no caso da história da música brasileira, essa riqueza fica ainda maior”, conclui.
O conteúdo dos programas do Estúdio F podem ser ouvidos e acessados gratuitamente no site da Funarte.
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